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08/12/23 às 07:15

MINERAÇÃO - Realocação de reserva legal entra em debate

Comissão presidida por Júlio Campos ouve Mato Grosso sobre esse tema que está nas manchetes

Redação

AguaBoaNews

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MINERAÇÃO - Realocação de reserva legal entra em debate

Júlio Campos preside a audiência pública

Foto: AguaBoaNews

Garimpo e mineração formam o grande pilar econômico mato-grossense, embora a atividade mineral direta represente apenas 4,72% do PIB estadual. No entanto, quando se vê a superlativa produção agrícola e as pastagens é possível dimensionar a importância do calcário calcítico e dolomítico nas lavouras e invernadas. Mas, a cadeia extrativa mineral vai muito além. Mesmo com seu peso econômico, social e histórico, ela sofre ataques de ambientalistas e de figuras que tentam solapar o desenvolvimento. Com a tramitação de um projeto de lei do governo estadual, que pede o direito de realocação de áreas de preservação permanente para a explotação de minérios, houve uma explosão crítica, que mesmo setorizada e pequena tenta ao máximo impedir a criação de uma lei nesse sentido. Para ouvir as partes, a Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ) da Assembleia realizou uma audiência pública na quarta-feira (6) para ouvir as partes. O presidente da CCJR, deputado Júlio Campos, não se manifestou ao longo do ato, mantendo postura de magistrado. Porém, após o término dos debates, disse a jornalistas que, “minério não vai atrás de minerador, mas o minerador tem que ir em busca do minério, desde que o faça dentro da legalidade observando dentre outro, os cuidados ambientais”.

Mato Grosso tem grande diversificação de minérios, do calcário ao diamante, do manganês ao ferro, do zinco ao estanho, da água mineral ao ouro, de tantos outros aos agregados da construção civil. Em algumas áreas as reservas dão sinais de esgotamento. Além disso, a expansão e diversificação econômica exigem resposta imediata. Esse cenário reforçado pela potencialidade para a exportação de ouro, diamante e minerais estratégicos levou o governador Mauro Mendes (União) ao projeto, que foi apresentado em setembro. A Assembleia decidiu que sua tramitação seria em regime de urgência urgentíssima, mas os deputados Wilson Santos (PSD) e Lúdio Cabral e Valdir Barranco (ambos do PT) pediram vistas do mesmo. No mês de novembro, em primeira votação, o projeto foi aprovado com 16 votos favoráveis e três contrários. As discussões em plenário levaram o caso para o Colégio de Líderes, onde ficou definida a audiência pública da CCJR em 6 de dezembro, mas a data da votação em segundo turno está em aberto.

A audiência pública ouviu dezenas de interessados no tema; e oito deputados estaduais se posicionaram sobre o projeto: Wilson Santos permaneceu contrário: Nininho (PSD), Janaína Riva e Thiago Silva (ambos do MDB), Carlos Avallone (PSDB), Gilberto Cattani (PL), Professor Gilmar Miranda (Cidadania) e Dilmar Dal Bosco (União) o defenderam.

O projeto de lei é objetivo, preciso e transparente. O mesmo não interfere na legislação mineral, que é de competência exclusiva da União. Seu objetivo é permitir que a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) possa autorizar a realocação da explotação para áreas de reservas legais, desde que cumpridos requisitos e normas legais: a superfície da reserva transformada em mineração tem que ser compensada por outra, do mesmo bioma, em Mato Grosso e com 10% ou mais de área para efeito de compensação. A atividade nessa realocação não poderá utilizar mercúrio, que é material pesado e cumulativo, e nenhum outro material de igual natureza. A mineração, seja ela qual for, e todas as ações com relação ao solo, água, flora e fauna estarão sob permanente fiscalização por parte da Agência Nacional de Mineração, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Sema, Ibama, ICMBio e órgãos municipais.

O conteúdo do projeto agradou mineradores e garimpeiros. Na audiência, o líder da Cooperativa dos Garimpeiros do Vale do Peixoto (Coogavepe), Gilson Cambuim, mostrou a transformação do garimpo nos municípios em sua base cooperada na divisa com o Pará. Cambuim lembrou as antigas práticas garimpeiras, que degradaram rios e deixaram crateras no solo, e destacou a modernização da atividade, que hoje faz da Coogavepe referência nacional, por seus cuidados ambientais. A cooperativa, que é a maior da área no Brasil, enfrenta problemas com a redução da extração do ouro, numa região onde há muitas reservas legais com grandes depósitos desse mineral. Cambuim recordou o caos urbano em Peixoto de Azevedo, em meados da década de 1990, quando o garimpo entrou em declínio provocando êxodo populacional. E não economizou elogios ao desenvolvimento após a entrada em funcionamento da Coogavepe, que faz de Peixoto uma cidade procurada por investidores urbanos e empresários do agronegócio.

Altamir Kurten, prefeito de Cláudia, abriu horizontes no debate sobre mineração em reservas legais. Kurten citou que a malha de rodovias sem pavimentação em seu município é grande e seu tráfego é basicamente feito por veículos pesados que transportam insumos e commodities agrícolas. A conservação dessas estradas depende de cascalho, mas as antigas cascalheiras, que fornecem esse material há 40, 50 anos, estão se exaurindo, o que obriga a prefeitura a buscá-lo em pontos muito distantes. O custo dessas operações é elevado. Se ao invés desse frete de longa distância, fosse permitido extrair o cascalho em áreas hoje com reservas legais, isso se traduziria em economia e mais caixa para investimento de rodovias pavimentadas, saúde, educação e em outras áreas.

O suplente de senador, ex-deputado estadual e ex-titular da Sema, José Lacerda, é um dos juristas mais respeitados em Mato Grosso. Lacerda sustentou a constitucionalidade do projeto de lei, e o defendeu por seu alcance social, reflexos econômicos e por assegurar a autossuficiência mato-grossense em minérios, inclusive os classificados como estratégicos.

Presidente eleito da Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM) e prefeito de Primavera do Leste, Leonardo Bortolin, reconheceu a importância mineral para o desenvolvimento de seu município. Bortolin explicou que Mato Grosso tem 141 municípios, e que os 141 prefeitos que respondem por eles são favoráveis ao projeto de lei.

Yassutaro Matsubara foi um empresário japonês polêmico e amigo do presidente Getúlio Vargas. Em 1953 Vargas doou 250 mil hectares na Gleba Rio Ferro, em Chapada dos Guimarães, para Matsubara implantar um projeto ancorado na pimenta-do-reino. A acidez do solo inviabilizou a produção. À época o calcário era desconhecido dos agricultores. Rio Ferro morreu, mas abriu o caminho à colonização japonesa em Mato Grosso. Bem ao lado daquela gleba surgiram duas cidades: Feliz Natal e Nova Ubiratã. Em 1983, transcorridos 30 anos da tentativa de Matsubara, Nova Ubiratã transformou-se num dos principais municípios agrícolas do mundo, com alta produtividade de soja, milho safrinha e algodão, graças ao calcário extraído em Nobres.

De Nobres, o empresário Kassiano Riedi, vice-presidente do Sindicato das Indústrias de Extração de Calcário de Mato Grosso (Sinecal), participou da audiência pública. Riedi demonstrou a importância daquele insumo mineral para o agronegócio. Argumentou que o frete, em alguns casos, é maior do que o preço do calcário, o que recomenda sua compra em mineradoras mais próximas às lavouras. Esse cenário contextualiza a necessidade da aprovação e sanção do projeto de lei que permitirá a realocação de reservas legais.

Suplente de deputada estadual pelo PSDB, a ex-professora universitária, geóloga, analista ambiental e coordenadora de Licenciamento de Empreendimentos Minerários da Sema, Sheila Klener, fez um pronunciamento na audiência pública onde mostrou o mecanismo institucional para se iniciar, dirigir ou ampliar negócios na área mineral. Com leveza na fala, Sheila deixou bem claro que o segmento empresarial que atua na área nada tem a ver com crimes de natureza ambiental que ocorrem em garimpos clandestinos.

Wilson Santos não recuou de sua resistência ao projeto de lei. Porém, nas cinco vezes em que ocupou a tribuna na audiência pública, o deputado intercalou elogios e críticas ao tema, mas sempre ressaltando que defende a mineração. O deputado pontuou que a colonização de Mato Grosso começou com a procura pelo ouro por bandeirantes e bandeiras; citou a fundação de Cuiabá por Moreira Cabral e as lendárias Minas do Sutil; por outro lado, o parlamentar denunciou a degradação do rio Sararé, da Bacia do Guaporé, que sofre as consequências do garimpo ilegal na Terra Indígena Sararé, os Nambikwara, nos municípios de Nova Lacerda, Conquista D’Oeste e Pontes Lacerda, no entanto, Dilmar Dal Bosco observou com seu colega que os danos sofridos pelo Sararé fogem da esfera mineral e está no campo da competência policial federal, por se tratar crime praticado em território sob a tutela da Funai. Wilson Santos lamentou o que chamou de “morte” do rio Bento Gomes, que é a principal fonte de abastecimento de água em Poconé – esse rio, segundo ele, sofre os efeitos da explotação do ouro por grandes mineradoras.

MEMÓRIA – O projeto de lei em tramitação é a segunda tentativa do governo em permitir a realocação de reservas legais para ceder espaço à mineração. Em 2022 a Assembleia aprovou e Mauro Mendes sancionou uma lei complementar nesse sentido, porém, com conteúdo diferente. O Ministério Público (MP) a judicializou e a mesma foi deixada de lado. Após conversação entre o Palácio Paiaguás e o MP, o assunto foi retomado junto à Assembleia. Antes mesmo da votação do segundo turno, Valdir Barranco anunciou que acionará a Justiça para derrubar qualquer iniciativa no sentido da realocação. 

AVALIAÇÃO – Júlio Campos considerou a audiência pública positiva. Destacou que assegurou direito de manifestação a todos os interessados e ao público nas galerias. O deputado deixou claro que não teme eventual judicialização do projeto de lei, que “deverá ser aprovado com folgada margem de votos”. No entendimento dele não há vício de inconstitucionalidade e o mesmo não fere a legislação ambiental mato-grossense, que “é a mais rigorosa no mundo”.
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