A Delegacia de Polícia Civil de Canarana, instaurou procedimento para apurar a conduta do técnico de segurança do trabalho C. E. J. S., funcionário da Agrícola Alvorada Ltda, situada naquele município. No dia 17 de novembro, o técnico não só impediu a atuação de um auditor-fiscal do trabalho às instalações da empresa como agrediu verbalmente o servidor público federal com palavras de baixo calão. Dois dias antes, um funcionário morreu soterrado por soja em um acidente naquela empresa, que também é algo de investigação.
O auditor-fiscal do trabalho Marcelo Semeão da Silva, lotado na Superintendência Regional do Trabalho em Mato Grosso (SRTE/MT), com sede em Cuiabá, registrou Boletim de Ocorrência (BO) na delegacia municipal e requisitou força policial para realizar a fiscalização na empresa. Ele foi designado pela SRTE especialmente para verificar essa ocorrência na parte concernente a saúde e segurança do trabalhador. Quatro agentes civis acompanharam o auditor-fiscal que só então pode realizar o seu trabalho na Agrícola Alvorada Ltda.
Semeão também gravou o vídeo, entregue à delegacia, que mostra a postura hostil do técnico de segurança do trabalho diante do auditor-fiscal do trabalho, que se manteve calmo e repetia ao agressor que só queria fazer o seu serviço.
A ida do auditor-fiscal do trabalho à empresa foi motivada pela morte do funcionário Leomar Inácio Schwaab, de 51 anos, identificado como encarregado da empresa, que foi a óbito depois de ser soterrado pela soja dentro do armazém (enfolfamento ), no dia 15 de novembro. O auditor-fiscal do trabalho já havia estado na empresa naquele dia, no período da manhã, ocasião em que fez inspeção visual da área do acidente, entrevistou trabalhadores que estavam com a vítima e solicitou documentos.
Ao requerer a entrada na plataforma aérea do armazém, o auditor-fiscal do trabalho recebeu a orientação de um outro funcionário para que aguardasse a chegada do técnico de segurança do trabalho, prevista para o período da tarde do mesmo dia. Ao retornar, o auditor-fiscal do trabalho foi recebido de forma raivosa pelo técnico de segurança do trabalho. O caso agora está sendo investigado pelo delegado Deudel Paixão de Santana, de Canarana.
“Ainda temos que ouvir todos os envolvidos nessa ocorrência, inclusive funcionários, mas pela descrição do BO e das informações que dispomos, em tese, já é possível verificar a ocorrência de dois delitos: desacato e resistência. Já é possível identificar que houve excesso por parte de C. E. J. S”, disse.
Paixão analisa que de um eventual delito de natureza administrativa chegou ao âmbito penal pelo tom depreciativo, ofensivo contra o servidor púbico federal. “É uma ocorrência incomum, mas que demonstra a falta de respeito com o servidor público, independente da esfera que ele atua. Se desrespeita o auditor-fiscal do trabalho hoje, amanhã o desrespeito é com o policial, é com a professora. Então é preciso bom senso nessas horas porque o servidor está fazendo o seu trabalho”, pondera.
Crime de resistência
O superintendente Regional do Trabalho em Mato Grosso, Amarildo Borges de Oliveira, lamentou o ocorrido e reforçou que o trabalho dos auditores-fiscais é cumprir a lei no sentido de assegurar a saúde e a segurança do trabalhador. “A restrição à atuação do auditor-fiscal do trabalho é uma forma de cercear o trabalho do Estado, de exercer sua função de verificar o cumprimento das leis trabalhistas. Normalmente uma restrição é sempre o indicativo sério e evidente de que há a intenção de esconder uma irregularidade ou ilegalidade”, completa ao dizer que o luto pela morte de alguém não pode ser impeditivo no cumprimento do dever pelo Estado.
Configura crime de resistência “opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio”, conforme descrição Art. 329 do Código Penal - Decreto Lei 2848/40.
É possível que o procedimento instaurado pela Delegacia de Polícia Civil de Canarana referente ao crime de desacatado se transforme em um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO). Trata-se de expediente usado para aqueles casos de menor potencial ofensivo e que cuja pena é inferior a 1 ano de reclusão, possível de ser convertida em prestação de serviço. Já no caso da morte do trabalhador, o caso virou um inquérito.
Interdição
No dia 17 de novembro, a Auditoria-Fiscal do Trabalho interditou a área do armazém por falta de documentação referente aos riscos envolvidos nas atividades no local, falta de medidas de proteção coletiva, falha nos procedimentos operacionais, falta de fiscalização com o ao uso de equipamentos de proteção e operação de máquinas por trabalhador não-treinado, conforme consta no relatório apresentado pelo auditor-fiscal do trabalho responsável pela inspeção.