Florestas tropicais na América do Sul perdem sua capacidade de absorver carbono
A revista Nature Climate Change publicou este mês um estudo, envolvendo cientistas britânicos, brasileiros e demais países da América do Sul, que revela que as florestas tropicais na América do Sul perdem sua capacidade de absorver carbono da atmosfera quando as condições se tornam excepcionalmente quentes e secas.
A pesquisa liderada pela Dra. Amy Bennett, pesquisadora da Universidade de Leeds (Inglaterra), que concentra os resultados das redes de pesquisa Rainfor (Inglaterra), Peld e PPBio (Brasil), obtidos por mais de 100 cientistas, que mediram florestas por décadas em 123 parcelas experimentais, descobriu que em nos anos de 2015 e 2016, quando um evento climático do El Niño resultou em seca e temperaturas mais quentes do que as registradas anteriormente, a Amazônia e todas as demais florestas sul-americanas não conseguiram funcionar como um sumidouro de carbono.
Membros equipe Rainfor
“Nós já sabíamos que as árvores na Amazônia são sensíveis às mudanças de temperatura e disponibilidade de água e que Amazônia desempenha um papel fundamental em retardar o acúmulo de gás carbônico na atmosfera, mas a investigação durante o El Niño nos deu uma visão do que esperar no futuro, mostrando como condições climáticas excepcionalmente quentes e secas poderão afetar as florestas e consequentemente o planeta", conta Bennett.
Esses registros diretos de árvore em árvore mostraram que a maioria das florestas atuou como um sumidouro de carbono na maior parte dos últimos 30 anos, com o crescimento das árvores superando a mortalidade, o que remove carbono da atmosfera e ajuda a minimizar o efeito estufa do planeta. Quando o último El Niño surgiu, este efeito foi comprometido devido a mortalidade de árvores provocada pelo calor e a seca.
O fenômeno da natureza, El Niño, ocorre quando as temperaturas da superfície do mar no Oceano Pacífico aumentam bruscamente, desencadeando uma grande mudança no sistema climático mundial. Nos anos de 2015 e 2016 o clima foi excepcionalmente quente para América do Sul. E há grande probabilidade que o fenômeno se repita em 2023 e 2024, com maior intensidade.
Entre os autores do estudo estão os professores e pesquisadores da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) Beatriz Marimon e Ben Hur Marimon. De acordo com a professora na borda da floresta tropical os efeitos foram ainda mais sentidos. “Aqui no sudeste da Amazônia, as árvores podem ter deixado de armazenar para emitir carbono e, embora as taxas de crescimento das árvores tenham resistido às temperaturas mais altas, quando esse extremo climático ocorreu, a mortalidade das árvores aumentou”, explica Beatriz.
Ben Hur reforça que o trabalho publicado pela Nature revela informações de extrema relevância para a tomada de ações governamentais de proteção às bordas da Amazônia. “A fim de impedir que este feite devastador progrida para o interior da floresta precisamos imediatamente de políticas públicas eficazes para conter o desmatamento ilegal e os incêndios na Amazônia, sob pena de degradação da floresta pelas bordas”, alerta o professor Ben Hur.
As florestas mais adaptadas ao clima seco são as mais vulneráveis
Para surpresa dos pesquisadores a expectativa de que as florestas mais úmidas fossem as mais vulneráveis ao clima extremamente seco, por estarem menos adaptadas a tais condições, revelou o contrário. O oposto era verdadeiro, as florestas mais adaptadas a um clima mais seco na borda da Amazônia acabaram sendo as mais vulneráveis, sugerindo que algumas árvores já estavam operando nos limites das condições toleráveis.
Antes do El Niño ocorrido em 2015 e 2016, os pesquisadores registravam aumento de remoção de gás carbônico (CO²) da atmosfera pela Amazônia de cerca de 300 kg por hectare a cada ano. Isso diminuiu para zero com as condições mais quentes e secas do El Niño, mudança devida à morte das árvores, o que os fez observar que o impacto relativo mais significativo do evento El Niño estava em florestas onde o clima já era relativamente seco.
Para o professor Oliver Phillips, ecologista da Universidade de Leeds que supervisionou a pesquisa e lidera a iniciativa global ForestPlots, as descobertas ofereceram esperança sobre a resiliência da natureza tropical sul-americana. “Os trabalhos de 30 anos de nossa equipe revelam que este El Niño não teve um efeito pior do que os anteriores na Amazônia, apesar de ter sido o mais intenso já registrado. O aumento da mortalidade de árvores ocorreu mais nas áreas mais secas na periferia da Amazônia, onde as florestas já estavam fragmentadas”.