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15/02/16 às 09:50

Extinção da revista vexatória garante direitos humanos e é defendida

Há quase dois anos, a Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh) regulamentou a Instrução Normativa nº. 002/GAB/Sejudh, de 16 de julho de 2014, que proibiu a revista íntima dos visitantes das 57 unidades prisionais de Mato Grosso. Signatário de protocolos internacionais que garantem os direitos do homem como o de Palermo, assinado em 2008; e a da Carta Internacional dos Direitos Humanos, assinada em 1990, o Brasil garante a todo e qualquer cidadão tratamento igualitário, digno e que assegure a integridade da pessoa humana.

O titular da pasta, Márcio Frederico de Oliveira Dorilêo, explica que, atendendo a estes princípios, os agentes procedem de outra forma ao abordar um visitante. De acordo com o gestor estadual, em caso de suspeita de que a pessoa esteja na posse de material ilícito de ingresso proibido no estabelecimento penal, poderá ser feita busca pessoal, devendo tal fato ser registrado em livro. “Além disso, se houver suspeita de que o visitante esteja com algo escondido nas partes íntimas, ele deverá ser encaminhado até uma unidade de saúde para exame de raio-X, evitando constrangimento na unidade. Quando for eliminada a suspeita, o visitante poderá entrar no local. Se o visitante se recusar a passar por exame, sua entrada não será permitida”.

A Secretaria Adjunta de Administração Penitenciária (Saap) explica que dentre os procedimentos que foram padronizados, está a precedência do ingresso de pessoas nos estabelecimentos prisionais, que deve ser feito mediante busca pessoal manual, ou com utilização de equipamentos que permitam identificar objetos portados. A revista em mulheres adultas será feita exclusivamente por mulheres, bem como a feita em homens adultos deve ser feita somente por homens. 

A revista em crianças só podem ser feitas pelos pais ou responsáveis, sob supervisão de servidor da administração prisional e, em caso de meninas, por servidoras mulheres, enquanto a revista em adolescentes será feita exclusivamente na presença dos pais. Já os portadores de marca-passo ou pessoas que não possam se submeter à revista por meio de aparelhos serão revistadas apenas manualmente. 
Se o visitante tentar entrar com objetos e produtos proibidos na unidade deverá ser impedido de fazer visita por 30 dias e, se for reincidente, esse período se estende para 60 dias. Caso seja autuado em flagrante, terá o nome excluído da lista de visitantes e estará proibido de entrar em qualquer unidade prisional até que seja absolvido da acusação.

Elogio e avanços
A extinção da revista íntima em pessoas que visitam recuperandos foi citada como exemplo pelo Judiciário do Estado do Amazonas na formulação de uma resolução com os mesmos fins. A iniciativa encontra similaridade em outros Estados, como Rio de Janeiro e São Paulo. “Mato Grosso é um dos estados pioneiros e isto é motivo de orgulho para todos nós”, destaca o secretário da Sejudh, Márcio Dorilêo.

Em dezembro de 2014, o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) recomendou a extinção da revista íntima, ação que foi atendida pelo Executivo do ente federativo. Goiás, Minas Gerais, Distrito Federal e Pernambuco são outros estados que adotaram a prática. Na Câmara dos Deputados, tramita o projeto de lei (7.764/2014) que acaba com a revista vexatória nos presídios do país, de autoria da ex-senadora Ana Rita. O projeto tramitou rápido depois da aprovação por unanimidade no Senado. 

Considerada humilhante e ineficaz, a revista vexatória afeta milhões de familiares de pessoas presas, que são obrigados a tirar a roupa, agachar repetidas vezes sobre um espelho e a passar por inspeção anal e vaginal antes de visitarem seus parentes. 

Para o diretor-geral do Departamento Penitenciário do Ministério da Justiça, Renato De Vitto, o fim das revistas vexatórias não pode estar condicionado à compra de equipamentos de vigilância eletrônica. “A revista vexatória contribui para o rompimento dos laços familiares e sociais, indispensáveis para a reintegração do preso na sociedade. “A manutenção dos vínculos é seguramente um dos caminhos mais importantes para evitar a reincidência. Não é um favor. É política pública.”

A advogada do programa de Justiça da Conectas, Vivian Calderoni, diz que o país já se encontra em movimento de abolir a prática. “Cabe ao Congresso Nacional a tarefa de seguir esse caminho, padronizando o procedimento em todo o Brasil”, completou. “Há vários anos o Brasil vem sofrendo seguidos constrangimentos internacionais por continuar a realizar rotineiramente a revista vexatória”, afirmou Raquel Lima, pesquisadora do ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania). Ela explicou que tanto a Organização das Nações Unidas (ONU) quanto a Organização dos Estados Americanos (OEA) já equipararam a nudez e as revistas à prática tortura.

Em audiência realizada na Câmara, o testemunho de Cremilda Teixeira ilustrou bem o impacto da prática na relação dos presos com a família. Ela visitou o filho preso semanalmente por mais de um ano e, todas as vezes, foi submetida à revista vexatória, como relatado à assessoria de imprensa da Casa de Leis. “É terrível ser estuprada todas as semanas. O Estado se vinga da mãe por um erro que o filho cometeu”, afirmou durante a audiência. “A tortura não se justifica em nenhuma situação. Ninguém deve pagar pelo crime do outro.”

Escola Penitenciária
A Sejudh destaca o trabalho desenvolvido pela Escola Penitenciária, que oferta uma série de cursos e capacitações aos servidores, a fim de que o agente penitenciário ao diretor aprimore conhecimentos e apure qualidades, como ocorre em cursos como o de Condutores de Cães Policiais e o de Desenvolvimento de Gestão de Pessoas e Padronização de Procedimentos Administrativos para o Sistema Penitenciário (Sispen), para ficar em poucos exemplos.

“Estas qualificações dão ao servidor mais embasamento para tratar qualquer assunto, e isso resulta numa melhor comunicação com o recuperando, num entendimento dos direitos humanos que são garantidos a todos. Assim, não há espaço para atos que tratem tanto a população carcerária, quanto aqueles que a visitam, como penitente”, avalia Dorilêo.
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