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08/06/22 às 21:13

Livros de Casaldáliga, inéditos em língua portuguesa, são publicados no Brasil

Traduzir poesia não é nada fácil. De autor falecido, mais complexo ainda. Mas este foi o desafio a que se propuseram estudiosos e o tradutor Eric Nepomuceno, na coletânea de Pedro Casaldáliga, publicada pela Entrelinhas Editora, em pouco menos de dois anos de seu falecimento.

O evento será presencial, em Cuiabá, com transmissão online pelas redes sociais do Sesc de Mato Grosso (Facebook e Youtube), e contará com a participação de estudiosos da obra de Casaldáliga, de Pedro Tierra e Eric Nepomuceno. Entre os pesquisadores, estarão presentes as coordenadoras a publicação, as professoras da Universidade Federal de Mato Grosso, Marinete Souza, Tereza Ramos e Célia Reis, o professor Vinícius Carvalho Pereira, e o padre Marco Antônio, representando a Prelazia de São Félix do Araguaia.Continua depois da publicidadeA coletânea e o projeto de publicação

“A Coletânea Pedro Casaldáliga, In Memoriam cumpre a função de suprir uma lacuna junto aos leitores de poesia – a de disponibilizar uma cuidadosa edição da obra original em espanhol, de Pedro Casaldáliga, também em Língua Portuguesa, em edição bilíngue –, e está composta, inicialmente, por cinco livros: Palabra ungida (Teologado Claretiano, Zafra, 1955), Llena de Dios y de los hombres (Teologado Claretiano, Salamanca, 1969), Clamor Elemental (Sígueme, Salamanca, 1971), Fuego y ceniza al viento. Antología espiritual (Sal Terrae, Santander, 1984) e El tiempo y la espera (Sal Terrae, Santander, 1986)”, nos contam as professoras Célia da Rocha Reis e Marinete Souza, na apresentação da coletânea. Llena de Dios y de los hombres e Clamor Elemental serão publicados proximamente.

“A origem do projeto da Coletânea se dá no contexto das atividades de pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem da Universidade Federal de Mato Grosso.”

Os três primeiros livros da coletânea estão sendo publicados pelo Edital Conexão Mestres da Cultura da Lei Aldir Blanc, lançado pela Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer de Mato Grosso. A proponente do projeto é a professora da UFMT Marinete de Souza, que junto com as professoras Célia Reis e Tereza Ramos de Carvalho, coordenaram a publicação da coletânea.

As professoras Marinete Souza e Célia Reis registram a importância do Mestre: “Casaldáliga foi um ativista que internacionalizou a região Leste do Estado de Mato Grosso por meio da defesa dos direitos humanos.

Favoreceu a Educação e a Cultura, dentre outras inumeráveis ações, ao abrir salas de alfabetização; ao escrever e levar à cena peças de teatro; ao criar, junto com a missionária Irene Franceschini (conhecida como Tia Irene), religiosa das Irmãs de São José, o Arquivo da Prelazia de São Félix do Araguaia; ao fazer parcerias com o pintor espanhol Cerezo Barredo, na criação de afrescos em toda a extensão territorial da prelazia; ao introduzir rituais nativos nas celebrações católicas e optar por apenas estar em aldeias indígenas do Parque Indígena do Xingu e Ilha do Bananal para lhes dar assistência, sem evangelizá-los, com o objetivo de não interferir na cultura nativa. Por tais razões, Casaldáliga é considerado um Mestre da Cultura do Estado de Mato Grosso, tendo recebido títulos de Doutor Honoris Causa em 2000, pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); em 2003, pela Universidade Federal de Mato Grosso; pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), em 2014; pela Universidade do Estado de Mato Grosso, em 2018.

Casaldáliga chegou ao Brasil em 1968 e, em 1971, tornou-se bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, em Mato Grosso. Nesses difíceis anos da ditadura e nos anos subsequentes, sua ação foi marcada por muitas lutas para tentar mudar a situação de opressão e exploração a que via submetido o seu povo. Um dos principais instrumentos de que dispunha era a escrita. Erudito, conhecedor do homem e da realidade social, histórica, dotado de talento para o texto literário e não literário, firme nos seus propósitos espirituais, o missionário espanhol produziu vasta obra, em grande parte publicada no exterior.”

Sobre a tradução e a edição – Parceira do projeto a convite de Marinete Souza, a Entrelinhas Editora buscou realizar uma cuidadosa edição, autorizada pela Prelazia de São Félix do Araguaia. Trouxe para a coletânea Eric Nepomuceno, premiado escritor, jornalista, tradutor e roteirista que traduziu para o português livros de alguns dos autores mais importantes da América Hispânica, como Eduardo Galeano, Julio Cortázar, Gabriel García Marquez, entre tantos outros.

“Fiquei muito feliz com a participação de Eric na tradução dos livros de Casaldáliga. Embora tenha traduzido poucos livros de poesia, uma história sua com um dos livros de Casaldáliga nos duros anos da ditadura no Brasil, o levou a realizar esta tradução, pelo que sou muito grata”, diz a editora Maria Teresa Carrión Carracedo.

Os novos textos em português inseridos nos livros, elaborados pelos professores pesquisadores da obra de Casaldáliga, por Pedro Tierra e Eric Nepomuceno, foram traduzidos para o espanhol por Ricardo Manuel Carracedo Cereijo. As ilustrações das edições originais em espanhol, do artista Cerezo Barredo, também ilustram os livros desta edição.

Percepções sobre cada livro, nos textos de apresentação

Palavra ungida (volume 1) – “Não é por acaso que a expressão ‘palavra ungida’ figure no título do primeiro livro de poesia de Pedro Casaldáliga. Trata-se do conteúdo que encontramos no conjunto de sua obra. Na construção das imagens poéticas que expressam esse conteúdo geral, em composições livres ou em formas líricas convencionais – soneto, trova, antífona etc., Casaldáliga revela proximidade com a natureza, vegetação, animais, águas. [...] Pela leitura dos poemas, observamos que esse poder e consciência resvalam num diálogo consigo e com a natureza, com fatos históricos, com personagens de narrativas literárias e de escrituras sagradas”. Célia Reis e Marinete de Souza

Fogo e cinza ao vento (volume 2) – “A poética da esperança se articula à do engajamento. Esta se direciona, por um lado, o de fora, como denúncia, contra as estruturas sociais que produzem as mais diversas formas de opressão, desde a explícita violência física até os sutis mecanismos de inculcamento de sentimentos de inferioridade. Por outro, direciona-se para o sujeito oprimido, para o dentro, a fim de lhe fornecer instrumentos necessários à autodefesa.” Michael Jhonatan Sousa Santos

O tempo e a espera (volume 3) – “... nos permite contemplar alguns espaços da fecunda vida interior deste homem profundamente votado à fé e à percepção mística do mundo. E, lança luz sobre os generosos mananciais religiosos ou profanos da tradição onde o poeta se curva para beber a palavra tocante que nos oferece para além dos compromissos éticos e de fé que nunca abandona.” Pedro Tierra

Sobre o autor - Pedro Maria Casaldáliga

Catalão, nasceu em 1928 em Balsareny, Barcelona (Espanha). Viveu em São Félix do Araguaia, no Estado de Mato Grosso (Brasil), da década de sessenta do século XX até agosto de 2020. Poeta, missionário e ativista das causas indígenas, camponesas, negras e femininas.

Seu legado poético e artístico é constituído por cerca de seis livros de poesia publicados em português e nove em espanhol. Entre as formas literárias que cultivou em seus livros estão o verso livre, sonetos, cantigas e haicais. Como ativista, também usou da palavra como forma de manifestar suas convicções e causas por meio de autoficção (diários) e do gênero epistolar, em certos casos tendendo ao texto comunicativo/jornalístico. O poeta teve ainda alguns temas que lhe foram caros, como a natureza (certa ecoliteratura), o sagrado, os povos, seres marginalizados e as águas.

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