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25/03/22 às 08:16 | Atualizada: 25/03/22 às 08:51

Falta de fertilizante leva pecuarista a adubar menos a pastagem


Alta nos preços dos nitrogenados afeta tanto os custos com adubação das pastagens quanto com a suplementação alimentar de bovinos (Foto: Everton Queiroz/Acrimat

Há mais de três décadas na atividade de cria de bezerros, este será o primeiro ano em que o pecuarista Lindomar Pedro de Resende abre mão de adubar as pastagens da sua propriedade em Ribeirão Cascalheira, no leste do Mato Grosso, onde mantém 150 vacas em 50 alqueires de terra. O município é conhecido como a capital do bezerro de qualidade do vale do Araguaia, reunindo em sua maioria pequenos produtores familiares fortemente afetados pela alta nos custos de produção e das taxas de juros no último ano, o que tem comprometido as margens da atividade.

“Não está fácil pra ninguém. Agora, para o pessoal que planta soja e depois de cinco a quatro anos volta pra pasto, aí está bom. Mas eu preciso de maquinário, financiamento e hoje, se eu bater na porta do Banco do Brasil, o gerente nem olha na minha cara”, explica o produtor ao comparar os custos com adubação de pastagens com e sem integração com a agricultura. Quando realizados de forma conjunta, a adubação feita para a lavoura é aproveitada, na mesma área, para o desenvolvimento das pastagens, diluindo os custos com um insumo cada vez mais caro e disputado no mercado internacional.

Se no ano passado o valor do fertilizante nitrogenado posto na fazenda girava em torno de R$ 2,5 mil a tonelada no leste mato-grossense, este ano os produtores estão precisando desembolsar até R$ 6 mil pela mesma quantidade enquanto a arroba encontra resistência para subir muito além dos R$ 300. "Não estou adubando e o pasto vai acabar, porque tem que deixar de adubar, não tem como adubar, tem que criar a vaca lá e fazer jogo de cintura".

A situação compromete as margens mesmo de quem já pratica a integração, como é o caso do pecuarista Sérgio Amaral de Almeida, de Canarana, também em Mato Grosso. “O boi não subiu tanto quanto os adubos porque não tem consumo. Tem o boi China, que é como se fosse uma carne à parte, e ele ainda está segurando um pouco se você conseguir fazer o abate antes de 30 meses. Agora, o outro boi que não é China, acima de 30 meses, ele já está muito apertado para fazer esse sistema”, revela o produtor.

Reduzir a idade de abate é visto como a principal saída para garantir retorno na criação de gado de corte em tempos de alta inflação e baixo consumo interno, mas é uma estratégia que exige investimento e uma gestão afinada da fazenda, como explica o professor do programa de pós-graduação em zootecnia da Unesp Jaboticabal e pesquisador da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), Flávio Dutra de Resende.

Há mais de três décadas na atividade de cria de bezerros, este será o primeiro ano em que o pecuarista Lindomar Pedro de Resende abre mão de adubar as pastagens da sua propriedade em Ribeirão Cascalheira, no leste do Mato Grosso, onde mantém 150 vacas em 50 alqueires de terra. O município é conhecido como a capital do bezerro de qualidade do vale do Araguaia, reunindo em sua maioria pequenos produtores familiares fortemente afetados pela alta nos custos de produção e das taxas de juros no último ano, o que tem comprometido as margens da atividade.

“Não está fácil pra ninguém. Agora, para o pessoal que planta soja e depois de cinco a quatro anos volta pra pasto, aí está bom. Mas eu preciso de maquinário, financiamento e hoje, se eu bater na porta do Banco do Brasil, o gerente nem olha na minha cara”, explica o produtor ao comparar os custos com adubação de pastagens com e sem integração com a agricultura. Quando realizados de forma conjunta, a adubação feita para a lavoura é aproveitada, na mesma área, para o desenvolvimento das pastagens, diluindo os custos com um insumo cada vez mais caro e disputado no mercado internacional.
 
"Não estou adubando e o pasto vai acabar""
Lindomar Pedro de Resende, pecuarista em Ribeirão Cascalheira (MT)

Se no ano passado o valor do fertilizante nitrogenado posto na fazenda girava em torno de R$ 2,5 mil a tonelada no leste mato-grossense, este ano os produtores estão precisando desembolsar até R$ 6 mil pela mesma quantidade enquanto a arroba encontra resistência para subir muito além dos R$ 300. "Não estou adubando e o pasto vai acabar, porque tem que deixar de adubar, não tem como adubar, tem que criar a vaca lá e fazer jogo de cintura".

A situação compromete as margens mesmo de quem já pratica a integração, como é o caso do pecuarista Sérgio Amaral de Almeida, de Canarana, também em Mato Grosso. “O boi não subiu tanto quanto os adubos porque não tem consumo. Tem o boi China, que é como se fosse uma carne à parte, e ele ainda está segurando um pouco se você conseguir fazer o abate antes de 30 meses. Agora, o outro boi que não é China, acima de 30 meses, ele já está muito apertado para fazer esse sistema”, revela o produtor.

Reduzir a idade de abate é visto como a principal saída para garantir retorno na criação de gado de corte em tempos de alta inflação e baixo consumo interno, mas é uma estratégia que exige investimento e uma gestão afinada da fazenda, como explica o professor do programa de pós-graduação em zootecnia da Unesp Jaboticabal e pesquisador da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), Flávio Dutra de Resende.


Professor Flávio Dutra de Resende durante visita à fazenda Santa Fé, em Canarana (MT)
(Foto: Everton Queiroz/Acrimat


“O aumento de custos assusta. Então, quando o pecuarista vê esse custo aumentando cada vez mais a tendência natural dele é recuar e cortar gastos. E normalmente ele corta um determinado insumo que é justamente o insumo que poderia ajudá-lo a passar por esse cenário”, explica o professor ao classificar a redução da idade de abate como o primeiro passo para aumentar a rentabilidade do pecuarista em tempos de crise. “É importante ter essa percepção, mas como o ciclo da pecuária é muito longo, muitas vezes o pecuarista se perde nesse planejamento ou não faz esse planejamento. Com isso ele fica tomando decisões pontuais e hoje na dá mais para fazer isso, ele precisa planejar a produção”, completa o pesquisador.

A convite da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), Flavio passou por três cidades do norte e nordeste de Mato Grosso para falar sobre gestão e produtividade pecuária entre os dias 17 e 19 de março, num evento que reuniu mais de 300 pecuaristas interessados em melhorar seus sistemas produtivos. Coordenador do projeto Boi 777, criado pela APTA para ajudar produtores a realizar sete arrobas a cada fase de desenvolvimento do gado (cria, recria e engorda), ele revela que a fórmula que já ajudou muitos a aumentarem a rentabilidade nos últimos anos está sendo revista diante do novo cenário econômico mundial.

“O que a gente percebe claramente é que está sobrando pouco dinheiro. Então nós, como pesquisadores, temos que ajudar esses produtores a encontrar saídas e já estamos trabalhando nessas saídas”, destaca o pesquisador ao apontar a cria de bezerros como a base para essa nova estratégia. “A gente está alertando muito os pecuaristas a produzir o chamado bezerro bom, ou seja, um bezerro que tem que ter genética, sanidade e que também venha a emprenhar mais cedo para que ele venha nascer mais cedo também”, observa Resende. O próximo passo, segundo ele, é chegar a um protocolo que permita atingir entre 7,5 e 8 arrobas no desmame – uma meta ambiciosa diante da média nacional, hoje abaixo de seis arrobas.

De acordo com o diretor de operações do Instituto Mato-grossense da Carne (Imac), Bruno de Jesus Andrade, a principal consequência da redução do investimento na cadeia produtiva é a queda na qualidade da carne produzida nessas fazendas, o que compromete valor pago pela arroba produzida, alimentando um ciclo vicioso que prejudica toda a cadeia produtiva.  “O que a gente acredita e tem trabalhado junto com a Acrimat inclusive é a necessidade de promover a intensificação da produção de uma maneira inteligente. Não é só usar a tecnologia para ter mais bois por hectares, mas utilizar a tecnologia para que você consiga ganhar mais reais por hectare e, partindo dessa lógica, você consegue ser produtivo na fazenda e não gastar recursos com tecnologias que podem não ser eficientes ao pecuarista naquele momento”, observa Andrade.

Entre as alternativas apontadas tanto por Andrade quanto por Resende estão medidas simples, como a associação entre produtores para a compra e venda a preços mais competitivos e a redução da lotação de animais em tempos de menor oferta de pastagem. “Existe um perfil do produtor pecuarista de não se unir com outros pecuaristas, mas essa é uma barreira que tem que ser quebrada porque o que a gente tem observado, principalmente no sul do país onde essa cultura do cooperativismo e associativismo é mais forte, é que existem resultados positivos”, completa o diretor de operações do Imac. Embora não veja riscos de desinvestimento no setor neste momento, dado o perfil exportador dos produtores mais tecnificados, ele não descarta que uma eventual piora do cenário econômico leve a esse processo. Já entre os que estavam no caminho, ele afirma que alcançar novos patamares de produtividade se tornou ainda mais difícil.

“Com certeza o pecuarista que hoje só produz a pasto e que estava pensando em fazer uma intensificação talvez espere um pouco mais porque o ambiente não aprece ser tão favorável. E aí, pelo fato dele não conhecer seus custos de produção, essa decisão acaba ficando mais difícil ainda”, alerta Andrade. Em Vila Rica, no nordeste de Mato Grosso, a orientação tem sido exatamente de cautela: “Nós não podemos hoje dar um passo muito grande pra frente porque depois talvez, pra encolher esse passo, fica mais difícil”, afirma o presidente do Sindicato Rural e diretor regional da Acrimat no município, Anísio Vilela Junqueira Neto. Embora veja a intensificação como um caminho sem volta, Netão, como é chamado por seus colegas, tem pregado a cautela na hora de realizar investimentos.

“O que nós não podemos fazer hoje é se endividar para fazer, mas sim fazer passo a passo. Se ia fazer dez, faz cinco. Mas tem que fazer. É saber o que realmente é possível continuar ou, do contrário, se é preciso que voltar atras. Mas acho que a gente chegou num ponto que não dá mais pra voltar pra atrás. Nós temos que chegar, talvez ganhando menos hoje, mas não pode deixar de ganhar”, conclui o diretor regional da Acrimat.
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