A ApexBrasil carrega a missão no próprio nome: Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos. É sua função apoiar empresários, atrair investimentos estrangeiros diretos, valorizar os produtos e serviços brasileiros lá fora.
Por isso, causaram espanto as declarações do presidente da Apex, Jorge Viana (PT-AC), que na segunda-feira (27) criticou o agronegócio brasileiro diante de uma centena de empresários e autoridades em Pequim, reunidos no fórum Brazil-China Business. É o mesmo evento que receberia a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), cancelada por orientação médica, após diagnóstico de broncopneumonia bacteriana.
Filiado ao PT, Viana foi prefeito de Rio Branco, governador do Acre e senador pelo estado. Em sua fala na China, ele associou o agronegócio ao desmatamento: “Nós, brasileiros, deveríamos parar de dizer fora do Brasil que o país não tem problema ambiental. Nós temos. Faz muito tempo”.
Na sequência, afirmou que o Código Florestal ainda não foi totalmente implementado e alegou que nos últimos 50 anos 21% da Amazônia foi desmatada. “Quero dar números bem objetivos. Falei que 84 milhões de hectares foram desmatados. Para que essas áreas estão sendo usadas? 67 milhões de hectares para a pecuária; 6 milhões para agricultura de grãos. E 15 milhões (são) de floresta secundária”, disse.
Palco das declarações do presidente da Apex, a China é o maior cliente do Brasil no exterior. Gastou US$ 91,3 bilhões em importações de produtos brasileiros em 2022 – quase duas vezes o montante da União Europeia, com US$ 51 bilhões.
As falas de Viana repetiram argumentos surrados, e sem fundamento, que tentam relacionar a agricultura brasileira, objetivamente a mais sustentável do mundo, a ações criminosas de grileiros e oportunistas contra a floresta.
Em seu perfil no Twitter, o próprio Viana, antes da repercussão negativa de suas declarações se espalhar, compartilhou reportagem do jornal "O Estado de S. Paulo" com o título “Presidente da Apex expõe na China desmatamento na Amazônia diante de gigantes do agronegócio”.
A senadora Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura no governo Bolsonaro, que costuma ser discreta em suas movimentações, reagiu. “A Apex sempre promoveu as exportações, onde o agro é campeão. Que Apex é essa que acusa o agro de desmatar a Amazônia diante de nossos maiores clientes, na China? Querem derrubar de uma só vez a imagem do país, o saldo comercial e o PIB? É muita insensatez!”, afirmou no Twitter.
Pela mesma rede, Viana respondeu: “Com todo respeito, mas a senhora está se pegando em uma desinformação. Minha fala aqui na China foi no sentido de promover o agro, outros setores e buscar promover nossas exportações e atrair investimentos...”.
A Apex sempre promoveu as exportações, onde o agro é campeão. Que Apex é essa que acusa o agro de desmatar a Amazônia diante de nossos maiores clientes, na China? Querem derrubar de uma só vez a imagem do país, o saldo comercial e o PIB? É muita insensatez!
— Tereza Cristina (@TerezaCrisMS) March 28, 2023
Frente Parlamentar da Agropecuária fala em "papelão" do presidente da Apex
O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado federal Pedro Lupion (PP-PR), classificou as falas de Viana de "papelão". "Lamentável ver uma agressão clara ao nosso agro vinda de quem está à frente de uma instituição que tanto ajudou a promover nosso setor no exterior”, disse.
Em nota, a FPA derrubou cada ponto levantado por Viana na China. “Exportamos para mais de 200 países com qualidade, eficiência e atendemos a todos os protocolos sanitários, ambientais e de mercado. O estrago vai além dos produtos agropecuários e atinge diretamente a imagem brasileira perante o mercado internacional”, disse a Frente.
As manifestações da FPA e da ex-ministra da Agricultura foram endossadas pela Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), que atua para apoiar o desenvolvimento sustentável do setor. “A Abag se sentiu muito desconfortável com o posicionamento da Apex num grupo de brasileiros que faz um road-show pela China, que busca abrir mercados. O contexto foi realmente muito negativo, mas acredito que a Apex vai reconsiderar o seu posicionamento. Tanto a ex-ministra Tereza Cristina quanto a FPA representam muito o que pensamos”, afirmou Caio Carvalho, presidente da associação.
Desculpas e culpa na distância entre Brasil e China
No dia seguinte às declarações, no mesmo evento, em Pequim, Jorge Viana se desculpou. Disse que foi um mal-entendido. “Sou engenheiro florestal de formação, fiz um histórico da situação nossa, especialmente na Amazônia, onde vivo, porque o Brasil teve um aumento do desmatamento nos últimos quatro ou cinco anos. Mas o foco meu não era, de jeito nenhum, deixar algum mal-entendido como pode ter ocorrido. Estamos muito longe do Brasil, acho que daqui para lá as coisas não chegaram do jeito que eu falei”.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, repetiu a tese de mal-entendido devido à distância física entre Brasil e China. “Talvez, pela distância daqui de Pequim até o Brasil, a conversa chega distorcida. Todos sabem que o seu posicionamento foi favorável à produção sustentável, para o bem da agricultura e chegou distorcida lá”, disse Fávaro, citado pelo portal Poder360.
Apenas uma semana atrás, o governo chinês tinha levantado o embargo à importação de carne bovina do Brasil, suspensa preventivamente desde fevereiro devido a um caso suspeito do Mal de Vaca Louca, descartado após exames laboratoriais. Isso foi contabilizado pelo Ministério da Agricultura como “saldo positivo” da missão brasileira à China.
Os argumentos que a Apex não usou para promover o agro
A nota oficial da FPA listou argumentos que a Apex poderia ter utilizado na promoção do agro brasileiro na China e no comparativo com países competidores em relação à sustentabilidade e preservação ambiental:
O Brasil possui 66% do seu território em vegetação nativa preservada ou protegida. Dados da Embrapa Territorial demonstram que proprietários rurais são os que mais preservam – 20,5% do país – com áreas de preservação permanente, reserva legal e vegetação excedente de suas respectivas propriedades;
Nenhum outro país do globo possui o modelo sustentável brasileiro, com leis ambientais rigorosas, como o Código Florestal, que impõem ao proprietário rural cotas de preservação ambiental da propriedade por bioma: 80% na Amazônia, 35% no Cerrado e 20% nos demais, além de manter preservação em cursos d’água;
A área de uso do território nacional para agricultura e pecuária soma 27,8%, atrás de países como China, (55,1%), Alemanha (46,6%), Estados Unidos (41,3%) e Argentina (39%), segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2022.
O Ipea registra que a expansão da área de produção agropecuária com tecnologias e práticas sustentáveis atingiu 154% da meta fixada no Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação da Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura (Plano ABC). O Plano é uma política pública.
“O Brasil, para que não reste dúvida, possui sustentabilidade na produção e vocação para alimentar o mundo, com respeito ao meio ambiente e combate aos crimes cometidos. Não aceitaremos que ideologias superem dados oficiais de satélite e a ciência”, conclui a FPA.
CNA envia ofício a Alckmin
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) enviou um ofício ao vice-presidente Geraldo Alckmin, que também é ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, em que demonstrou preocupação o posicionamento da Apex-Brasil. A entidade ressaltou a importância do setor e se colocou à disposição para disponibilizar "informações fundamentadas e atualizadas sobre a sustentabilidade do agro brasileiro".
Fonte: Gazeta do Povo