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15/08/21 às 09:53 / Atualizada: 15/08/21 às 10:27

Gado pela internet

Leilões virtuais de gado crescem na pandemia, têm receitas maiores e melhoram bem estar do gado

Sebastião Nascimento, Colaboração para o UOL

AguaBoaNews/São Paulo

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Gado pela internet

Fazenda Rio Bonito / Água Boa-MT

Foto: Estância Bahia Leilões

Quem se lembra dos leilões presenciais de gado e cavalo realizados em recintos lotados e com a conversa correndo solta e alegre entre a plateia de produtores rurais? Os animais em oferta desfilavam pelo palco e os lances dados para adquiri-los giravam aceleradamente no placar eletrônico.

Negócio fechado, o martelo do leiloeiro ressoava pelo ambiente e em seguida a comemoração irrompia. Cumprimentos e abraços eram acompanhados de um drinque.


Recinto do Mega Leilão/2019 da Estância Bahia em Água Boa - Foto: Wolney Domingos

Mas em março e abril do ano passado a mudança veio rápida e foi radical. A pandemia do coronavírus fez com que o modelo presencial de leilões, predominante no país há mais de 50 anos, fosse substituído em quase 100% pelas vendas virtuais, seja pela TV, Internet e outros meios. O comprador passou a acompanhar a apresentação online do gado acomodado no sofá ou no escritório da sua propriedade.

Fazendeiros, diretores de empresas leiloeiras e analistas de mercado são unânimes ao avaliarem que os remates virtuais decretaram o fim das frutíferas trocas de experiências e informações entre os participantes, mas, de outro lado, apresentaram forte aumento no número de eventos, no preço médio dos animais e no faturamento bruto.

A maioria das vendas teve médias e receitas até 80% maiores, superando de longe as expectativas das empresas e dos proprietários dos animais.

"Superadas as incertezas iniciais, a temporada de 2020 foi excelente apesar da pandemia. Todo mundo ficou feliz. Houve adaptação por parte de vendedores e compradores, as receitas subiram e a liquidez foi a tônica", afirma Lourenço Campo, da Central Leilões, de Araçatuba (SP), que atua em todos os Estados. Ano passado, quase todos os leilões foram virtuais e alcançaram faturamento de R$ 1,2 bilhão.

E como a quantidade de pregões igualmente disparou, a receita agora em 2021 pode atingir picos "históricos", ele prevê.
 
Divulgação
Gado é filmado para participar de leilão virtual

 
Resultados surpreendem positivamente
 
"No primeiro semestre de 2021 as vendas virtuais ficaram consolidadas", afirma Lourenço Campos. O otimismo é baseado nos resultados alcançados pela Central Leilões em 2020, com um faturamento de R$ 430 milhões, 80% superior ao de 2019.

O empresário da empresa de leilões de Araçatuba, SP, diz que não é ainda possível prever o movimento total de sua empresa para 2021. "O certo é que de janeiro a julho faturamos 70% a mais em relação a igual período de 2020."

Segundo Lourenço, vencido o que poderia ter sido um pesadelo, ou seja, a migração apressada do modelo presencial para o universo digital, a comercialização de animais chegou ao patamar de cotações jamais visto.

Os números ainda não são definitivos, lembra Lourenço, mas ele adianta que é aguardado um recorde no faturamento dos leilões promovidos em 2020 em todo o Brasil. O valor deverá chegar a R$ 1,2 bilhão, mais de 30% superior ao alcançado no ano de 2019.

Afora a movimentação financeira recorde, Lourenço ressalta a liquidez como um dos fatores a elevar a média obtida pelo gado no ano passado em comparação a 2019. "Predominou o que denominamos de pista limpa", explica.

Segundo Lourenço, foram virtualmente licitados mais de 95% dos bovinos ofertados no ano passado. "É o atestado definitivo a comprovar a eficiência e a aceitação da mudança", diz.

Para o empresário, que também é leiloeiro, a comercialização de gado foi ainda auxiliada pela cotação remuneradora da arroba em 2020 e que prossegue em 2021.

Analistas acreditam que a arroba (cerca de 15kg) deva atingir entre R$ 350 e R$ 370 até o final do ano. Hoje, a arroba está em R$ 320 e os sinais são de acréscimo por conta da baixa oferta de animais para o abate.


 
Experiência de quase 60 anos
 
José Luiz Niemeyer dos Santos, de Guararapes (SP), é um dos mais influentes selecionadores de gado do país. Aos 83 anos de idade, Niemeyer promove leilões presenciais e participa como comprador desde o final da década de 1960 - hoje, todos os eventos são à distância.

Ele confessa sentir falta do bate-papo com os amigos produtores nos leilões que reuniam público. "É instrutivo, pois trocamos impressões acerca do desenvolvimento dos nossos criatórios, e tudo é muito alegre."

Mesmo assim, Niemeyer adaptou-se plenamente à mudança para o virtual. No último dia 4 de julho, o produtor "limpou a pista" e vendeu toda a oferta de nelore e brangus do seu Leilão Terra Boa.

Em 2020, ele já havia aderido aos negócios virtuais e ficado bastante satisfeito.

"Só com os machos nelore obtive a média de R$ 27 mil. Em 2020, a média havia dado R$ 17 mil." Uma das vantagens, diz Niemeyer, é que a transmissão chega a todos os cantos do país.

Tem mais, relata o criador: "Os custos diminuíram bem, afinal não é necessário mais transportar o gado, alugar recintos e ter gastos com bebidas, enfeite de palcos e etc."

Do alto de seus mais de quase 60 anos realizando remates e também comprando animais, Niemeyer crê que não há mais volta. "Realmente, a tecnologia chegou e encerrou um ciclo. A venda virtual se consolida."

O fazendeiro admite que num universo de centenas de pregões anuais será possível promover alguns no modelo presencial, para dar a oportunidade de manter o diálogo com os colegas de profissão. "Quando passar o sofrimento trazido pelo vírus", declara.

 
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Gado não precisa ser deslocado, o que melhora seu bem-estar

 
Mais conforto para o gado
 
O Mato Grosso possui o maior rebanho bovino do país. Os leilões de animais para cria, recria e engorda estão entre os maiores em oferta e em número de eventos.

Nos pregões realizados presencialmente o público precisava deslocar-se às fazendas distantes e os animais sofriam com o transporte em caminhões, recorda Maurício Tonhá, da Estância Bahia Leilões, de Água Boa. "A mudança para o virtual, que já ocorria moderadamente no Brasil, irrompeu de repente e trouxe uma dose de incerteza que foi afastada logo após os ganhos vindos nos primeiros leilões."

A Estância Bahia comandou 250 remates em 2020, batendo os 200 do ano imediatamente anterior. Tonhá adianta que a expectativa é crescer um pouco mais no ano corrente (10%), apesar da seca estar castigando as pastagens das fazendas mato-grossenses.

Ele observa que os promotores dos leilões estão satisfeitos com o avanço do bem-estar animal. "O gado não precisa mais ser transportado pelos caminhões aos recintos. Ele é filmado na fazenda em seu ambiente natural", afirma.

Tonhá acredita que os leilões virtuais se consolidam a cada dia que passa. "Não há volta", afirma.


 
Presencial não vai morrer
 
Cristiano Prata Rezende, proprietário da empresa de leilões Leilopec, confessa que uma parte do seu público é carente dos encontros propiciados pelas vendas presenciais.

"É muito bom o diálogo com outros criadores. Pode anotar: o leilão presencial não vai morrer. Diminuir sim, e muito", diz o empresário de Uberaba, no Triângulo Mineiro, conhecida como a capital do gado zebu, como a raça nelore.

Ele informa que, na cidade, a liberação está ocorrendo aos poucos e deverá reunir menos gente no recinto, com uma oferta também menor de gado. Assim, os pregões veiculados virtualmente serão muito mais expressivos.

"A Leilopec esteve à frente de 80 pregões virtuais em 2020 e já temos marcado 100 para este ano de 2021", diz.

Luciano Rezende frequenta os remates de gado há pelo menos 50 anos e fundou a Leilopec em 1980.

Bom exemplo de pregão movimentado realizado pela Leilopec foi o Virtual Marcelo Farha e Convidados, no final de julho. Foram ofertados 3.000 animais para cria, recria e engorda, entre machos e fêmeas de diversas raças, e o faturamento chegou aos R$ 10 milhões, com uma média geral de R$ 3.400.

A transmissão foi pelos sites da leiloeira e pelo seu canal no Youtube.


 
Modalidade veio a galope
 
Com a CFM Agropecuária, uma das maiores produtoras de touros do Brasile que fica em São José do Rio Preto (SP), os negócios virtuais foram iniciados em agosto de 2020 após 22 anos recebendo o público na fazenda.

Segundo Tamires Miranda Neto, diretor de pecuária do grupo, a oferta de touros no megaleilão foi arrematada totalmente, enquanto o faturamento de R$ 8,34 milhões é recorde e subiu 36% diante de 2019.

A transmissão virtual permitiu a compradores de 10 Estados o arremate da tourada. Na próxima quinta-feira, dia 5, Tamires informa a realização de mais um megaleilão pela TV e internet. Serão 500 touros.

Nilson Genovesi, leiloeiro rural há 38 anos, afirma ter assistido a várias mudanças no setor. "Mas as vendas virtuais foram radicais, chegaram no galope, tanto as de cavalos como as de bois, e surpreenderam positivamente o mercado em 2020."

Segundo ele, os resultados financeiros foram superiores aos de 2019. "Destaco ainda a liquidez. Ficou todo mundo satisfeito", afirma.

Nas vendas de cavalo, Genovesi diz que a emoção dos leilões presenciais foi substituída pelo maior foco dos virtuais, já que as informações são passadas ali na telinha ou pela internet e o público dedica mais atenção.

Para ele, "a queda da taxa de juros em 2020 também ajudou o mercado de cavalos, gado de elite e comercial. Muito investidor aplicou na criação como alternativa de negócios", afirma Genovesi.

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