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25/12/20 às 21:52 / Atualizada: 25/12/20 às 22:21

Conheça Feliz Natal, cidade que nasceu do agronegócio

Nome desse município de MT surgiu de um alagamento na véspera de Natal e cresceu em torno de um posto de combustível. Cidade se desenvolveu junto com as madeireiras, mas agricultura e pecuária vão tomando o espaço da produção e da economia local.

Rikardy Tooge

G1 Mato Grosso

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Feliz Natal desejando um feliz Natal — Foto: Prefeitura/Divulgação
 
Feliz Natal, além de ser a expressão mais usada nesta sexta-feira (25), é também um dos nomes mais inusitados entre os 5.570 municípios brasileiros.
 
Essa cidade de Mato Grosso, nascida da migração de pessoas do Sul do Brasil em busca de terras para trabalhar na Amazônia, é jovem, tem 25 anos, mas já era área de produção desde os anos 1970, quando era um distrito do município vizinho, Vera.
Conheça Feliz Natal, município de Mato Grosso — Foto: Elcio Horiuchi/G1
Conheça Feliz Natal, município de Mato Grosso — Foto: Elcio Horiuchi/G1
 
E, sim, nome da cidade surgiu por causa do Natal. Mas foi de comemoração frustrada.
 
Tudo começou no dia 23 de dezembro de 1978, quando trabalhadores de uma fazenda da região onde hoje é a cidade voltavam para casa para as comemorações natalinas.
 
Para chegar até Vera e Sinop, cidades onde viviam, era necessário passar por uma longa estrada de chão. Só que era a época de chuvas na região, e o atoleiro impediu o prosseguimento da viagem.
 
Com isso, precisaram passar a véspera de Natal no local, até a chuva diminuir. Como lembrança um dos trabalhadores entalhou em uma árvores a frase “feliz Natal”, virando assim um ponto de referência na região.
 
Feliz Natal ou ‘Postinho’?
 
Fantástico, em 2014: Me Leva Brasil visita a cidade Feliz Natal, no Mato Grosso
Fantástico, em 2014: Me Leva Brasil visita a cidade Feliz Natal, no Mato Grosso
 
“Para os moradores da região virou a 'tora de feliz Natal', aí depois 'feliz Natal' e foi ficando. Tinha essa referência e o posto de combustível do meu pai”, recorda o produtor rural Moisés Debastiani, filho de um dos fundadores da cidade, Antônio Domingo.
 
“Quando foi para emancipar, pensamos 'vamos colocar que nome?' Não vamos colocar ‘postinho’. Ouvimos os pioneiros da década de 1970, fizemos um plebiscito e ficou o nome de Feliz Natal.”
 
Antônio, o patriarca dos Debastiani, chegou na região no início dos anos 1980. Funcionário de uma madeireira em Santa Catarina, largou o emprego para tentar a sorte nas áreas do Centro-Oeste e Amazônia.
 
Era em um período em que o governo militar facilitou a compra de terras nesta região para popular uma área até então pouco explorada do Brasil. O lema era “integrar para não entregar”.
 
Ele adquiriu um posto de combustíveis que ficava em uma propriedade rural da região, em um entroncamento com uma estrada que levava para cidades maiores, como Nova Ubiratã.
 
Postinho da família Debastiani em Feliz Natal, Mato Grosso — Foto: Moisés Debastiani/Arquivo Pessoal
Postinho da família Debastiani em Feliz Natal, Mato Grosso — Foto: Moisés Debastiani/Arquivo Pessoal
 
Com a expansão da atividade agrícola, especialmente de madeireiras, Antônio foi ampliando o comércio local, com a abertura de mercado e farmácia para atender esses trabalhadores.
 
“A gente não tinha nem ideia que fosse virar município. A ideia do meu pai era trazer esses amigos (de madeireiras) para cá porque ele precisava de clientes, foi uma questão comercial. Mas cresceu tanto que decidiram emancipar a cidade em 1995”, explica Moisés.
 
E foi em novembro de 1995 que o distrito de Vera virou a cidade chamada Feliz Natal. Em 1996, Antônio Domingo Debastiani, pai de Moisés, foi eleito o primeiro prefeito da cidade.
 
Todo mundo contribuindo
 
A transformação da família e, também, da cidade passou pelo postinho dos Debastiani. O empreendimento foi a porta de entrada para a consolidação de Feliz Natal como município.
 
Moisés, hoje com 44 anos, chegou no que é a cidade atualmente aos 7 anos. A família partiu de Maravilha, em Santa Catarina, para Sinop em 1983. Para resumir, ele se apega ao clichê.
 
“A única coisa que você via era só mato. A gente passava Natal, ano novo… era uma tristeza só, não tinha o que fazer. A brincadeira era andar a cavalo”, diz.
 
Distribuição de presente de Natal no posto da família Debastiani — Foto: Moisés Debastiani/Arquivo pessoal
Distribuição de presente de Natal no posto da família Debastiani — Foto: Moisés Debastiani/Arquivo pessoal
 
Ele conta que serviços comuns nas grandes cidades não eram tão simples na região, como a energia elétrica.
 
“Até 2000, a energia da cidade era energia a motor, no óleo diesel. Era muito caro ter energia 24 horas, então desligava durante à noite. Os motores foram comprados pelo meu pai, e os moradores criaram uma associação para comprar o diesel”, recorda.
 
“A gente conseguiu trazer o linhão (de energia) para Feliz Natal, tiramos os postes de madeira antigo, foi uma refundação. Isso tudo com ajuda dos produtores rurais e das madeireira, foram 3 mil postes para trazer energia de Sinop e todo mundo contribuiu.”
 
Vista de cima da praça principal de Feliz Natal — Foto: Prefeitura de Feliz Natal/Divulgação
Vista de cima da praça principal de Feliz Natal — Foto: Prefeitura de Feliz Natal/Divulgação
 
Após 3 mandatos de prefeito de Feliz Natal, sendo o último em 2012, o pai de Moisés divide o tempo entre Santa Catarina e Mato Grosso. Os negócios criados por ele são tocados pelos 3 filhos.
 
Família Debastiani: Moisés, Simone, Marilene, Thiago e Antônio — Foto: Moisés Debastiani/Arquivo pessoal
Família Debastiani: Moisés, Simone, Marilene, Thiago e Antônio — Foto: Moisés Debastiani/Arquivo pessoal
 
Moisés cuida da propriedade de 6,5 mil hectares na região, o irmão Thiago é responsável pelo armazém e a irmã Simone cuida da colonizadora – empresa responsável pela expansão da cidade a partir da venda de terrenos. Foi da empresa que foram feitos os primeiros projetos de ruas e bairros da cidade.
 
Já o postinho não é mais da família, ele foi vendido em 2012.
 
Desenvolvimento a partir do agro
 
Mato Grosso é um estado moldado pelo agro. Com incentivo e pesquisa do governo militar, se tornou o maior produtor nacional de alimentos, em especial grãos (soja e milho) e carne bovina.
 
Existem três biomas no estado: Amazônia, Pantanal e Cerrado, sendo este último a maior parte do território. Já Feliz Natal está mais ao norte, na parte amazônica.
 
Desde a expansão do Centro-Oeste, nos anos 1960 e 1970, a madeira foi uma das principais atividades econômicas de Mato Grosso, inclusive de Feliz Natal.
 
O primeiro motivo é porque a abertura de lavouras e pastos dependia da derrubada de árvores, que então eram comercializadas. Segundo é que a legislação ambiental da época era diferente – a lei atual, o Código Florestal, foi atualizada apenas em 2012, depois de mais de 45 anos.
 
Neste contexto, atividade madeireira foi a que iniciou o desenvolvimento de Feliz Natal, mas, com o passar do tempo, a pecuária tomou espaço dessas áreas derrubadas. As primeiras lavouras começaram no final da década de 1990 e chegaram para ficar.
Relação com o agronegócio está no emblema da cidade  — Foto: Prefeitura de Feliz Natal/Divulgação
Relação com o agronegócio está no emblema da cidade — Foto: Prefeitura de Feliz Natal/Divulgação

 
“Hoje, deve ter umas 15 madeireiras na cidade, mas chegou a ter mais de 80. A madeireira vai abrindo área e só pode tirar novamente após 25 anos, também começou a ter consciência de trabalhar dentro das novas normas e o pessoal migrou”, conta.
 
Atualmente, a produção de soja é a principal da cidade, muito à frente do setor madeireiro. Juntas, agricultura e pecuária, respondem por quase metade do Produtor Interno Bruto (PIB) do município.
Porém, isso não significa que o desflorestamento acabou na região. Anualmente, o governo de Mato Grosso realiza operações para evitar o desmatamento ilegal no município e no entorno.
 
Moisés Debastiani explica que, ao mesmo tempo em que a exploração de madeira vai perdendo espaço, a agricultura vai ocupando esse lugar.
 
“A produção rural trouxe desenvolvimento para a região. O ramo madeireiro era forte no início, houve transição para a pecuária e, depois para a agricultura. A terra é muito fértil e muito boa aqui”, diz Moisés.
 
Para o agricultores que chegam agora nessa região, precisam seguir a exigência do Código Florestal, que determina que só é permitido produzir em apenas 20% da área – os outros 80% devem ser preservados.
 
Quem tem propriedade no bioma antes de julho de 2008 e produz em uma área maior que a permitida, deve aderir ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) previsto na lei, em que é possível restaurar o que excedeu de 20% em mais de 20 anos.
 
“Atualmente, a maior parte dos produtores (de Feliz Natal) está no 80%/20%”, diz Moisés.

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