Um mês após receber alta do Hospital Materno Infantil (HMI), em Goiânia, o gêmeo siamês Heitor Brandão, de 6 anos, voltou na madrugada desta quarta-feira (1º) para a cidade Riacho de Santana (BA), onde mora a família. O garoto sobreviveu à cirurgia de separação do irmão Arthur, que morreu três dias após o procedimento.
A mãe do Heitor, a professora Eliana Ledo Rocha, contou que o garoto estava ansioso para rever o pai e a irmã, que já estão na Bahia. "Nós vamos voltar sempre aqui ao estado de Goiás para fazer o acompanhamento dele. A gente vai, mas a gente volta", afirmou a mãe.
A cirurgia de separação foi realizada em fevereiro deste ano. Após receber alta médica, no último dia 27 de maio, o garoto permaneceu com a mãe na Casa do Interior, abrigo de apoio da Organização das Voluntárias de Goiás (OVG), onde se hospedam desde que chegaram ao estado, pois precisava refazer os curativos. Agora, quatro meses após a operação, Heitor já anda com a ajuda de uma cadeira de rodas motorizada.
ALTA
A saída de Heitor do HMI foi marcada por muita felicidade. Na ocasião, o pai da criança, o professor Delson Brandão, disse que era uma “emoção indescritível”.
A despedida de Heitor também comoveu a equipe médica, que acompanhava a criança há seis anos e, mais intensamente, nos últimos meses, após a cirurgia de separação. Em meio a beijos e abraços, funcionários deram uma salva de palmas de despedida. Os pais agradeceram o apoio e o cuidado que eles tiveram com Heitor.
Funcionários se despedem de Heitor Brandão quando o garoto teve alta (Foto: Paula Resende/ G1)
O menino também contou com uma surpresa do grupo Semeadores da Alegria. Os artistas, que visitavam os pacientes aos sábados, cantaram a “Música das Bênçãos” e “Conquistando o Impossível”. Heitor cantou e dançou as coreografias.
Já os funcionários da Casa de Apoio comemoram a alta de Heitor. Eles decoraram o abrigo com balões e cartazes, além de preparar um cardápio especial para o menino, que incluiu bolo de chocolate.
NASCIMENTO
Natural de Riacho de Santana, cidade do interior da Bahia, a mãe de Arthur e Heitor, Eliana Ledo Rocha Brandão, veio à Goiânia um mês antes do nascimento dos filhos para que eles tivessem acompanhamento desde o parto, em abril de 2009. Eles eram unidos pelo tórax, abdômen e bacia, compartilhando o fígado e genitália.
Quando os meninos nasceram, Eliana e o marido já tinham a filha, que na época tinha 1 ano e 10 meses. Dentre as várias adaptações feitas pela família para acolher os filhos siameses, a mãe passou a amamentá-los simultaneamente, tornando o ato mais confortável para ela e os bebês.
Desde o nascimento, eles se preparavam para a cirurgia de separação. Para facilitar os cuidados com Arthur e Heitor, que recebiam atendimento especializado no HMI, Eliana se mudou para Goiânia. Enquanto isso, Delson permaneceu na Bahia para garantir o sustento dos familiares.
SEPARAÇÃO
Antes da cirurgia se separação, Eliana afirmou que, apesar das restrições físicas, os filhos não possuíam nenhum problema cognitivo. Com personalidades “totalmente diferentes”, os gêmeos sonhavam com o procedimento. "Eles querem se separar, não querem desistir porque sabem que vão ter liberdade, uma independência maior, poder ir sem precisar da permissão do outro", disse a mãe antes da cirurgia.
Entre 2013 e 2014 os garotos passaram por procedimentos para a colocação de bolsas expansoras de pele. “Elas vão esticando a pele devagar, é como se fosse uma gravidez. Precisa de pele para cobrir o corte da separação. Se o processo não é feito, o risco de morte é altíssimo”, explicou na época o cirurgião Zacharias Calil.
Por fim, o procedimento aconteceu em 24 de fevereiro deste ano. A cirurgia durou cerca de 15 horas. Para realizar o procedimento, Calil e sua equipe tiveram auxílio de uma técnica chamada prototipagem, na qual impressoras 3D reproduzem órgãos do corpo humano em tamanho real. Segundo Calil, a aplicação dessa técnica em cirurgias de separação de siameses em Goiás é pioneira no país e permite simular o procedimento.
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iamês separado Heitor Brandão recebe alta do Hospital Materno Infantil (Foto: Paula Resende/G1 Goiás)
Após a separação, os médicos informaram que a cirurgia transcorreu dentro do esperado. Inclusive, eles tiveram uma boa notícia, pois, diferentemente do que acreditavam, cada um dos gêmeos tinha um intestino, uma bexiga e uma vesícula.
MORTE DO IRMÃO
De acordo com a equipe médica, os primeiros dias após a cirurgia eram decisivos para a recuperação dos meninos. Conforme explicou Calil, na ocasião, enquanto eram ligados, Arthur dependia mais do irmão e, após a separação, seu estado de saúde se agravou. Três dias após a cirurgia, ele sofreu paradas cardíacas, não resistiu e morreu.
Os pais das crianças optaram por enterrar Arthur na Bahia. Segundo Eliana, Heitor só foi informado da morte do irmão dias depois. “Ele perguntou onde estava o Arthur e eu expliquei que Deus tinha chamado ele porque no céu tinha muita criança triste, e o Arthur era muito alegre e no céu poderia alegrar as outras crianças”, conta a mãe. Ainda segundo ela, Heitor diz que sente falta do irmão, “mas não está triste porque sente Arthur no coração dele”.