Artigos / João Baptista Herkenhoff

20/11/16 às 16:41

Lei ou Justiça?

Em outros tempos o debate sobre assuntos jurídicos só interessava aos profissionais respectivos: magistrados, membros do Ministério Público, advogados e também aos estudantes que se preparavam para ingressar nesse mundo.
 
Hoje a Ciência do Direito, cultivada por Grócio, Calamandrei, Rui Barbosa, Tobias Barreto, Augusto Emílio Estellita Lins, Eurípedes Queiroz do Valle, abre-se ao interesse geral.
 
O jurista argentino Carlos Cóssio realizou, na área do Direito, uma revolução semelhante àquela do polaco Nicolau Copérnico na Astronomia. Irrompeu, na mente de Cóssio, esta intuição genial: o Direito é conduta, e não norma. Em consequência, a Hermenêutica Jurídica, que é a arte de interpretar as leis, deve ter por objeto a conduta, e não apenas o texto. Dentro dessa postura, o indivíduo julgado é integralmente substituído por sua fatalidade, ou contingência.
 
Na mesma linha de pensamento colhemos em outros doutrinadores:
 
“O aplicador não deve encerrar-se no domínio da rígida lógica formal e não deve dar valor maior às inferências. O legislador quis afastar o aplicador do apego a tais métodos, ao determinar-lhe que atenda aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum.” (Alípio Silveira).
 
“Mais que o conhecimento dos autos, o juiz criminal deve conhecer o homem submetido a seu julgamento.” (Moura Bittencourt).
 
“O legislador tem as insígnias da soberania; mas o juiz possui as suas chaves.” (Carnelutti).
 
 “A lei não é sagrada; só o Direito é sagrado.” (Triepel).
 
 “O interesse de manter a segurança jurídica não pode prevalecer sobre o interesse de fazer triunfar a Justiça substancial sobre a Justiça meramente formal. (Manzini).
 
Pontes de Miranda assinalou o conflito entre o direito dos juristas e o direito do povo. Não é um “subversivo” da ordem jurídica que nega o monopólio da lei como instrumento normativo da conduta, mas um douto, respeitado em todo o territóio nacional. Está no “direito do povo” que ser criminalmente processado é uma pena, no sentido de que aflige. Sintomático é constar dos termos de interrogatório que o acusado “nunca foi preso e nem processado”.
 
O desembargador Homero Mafra, quando ainda era Juiz de primeiro grau, absolveu dois jovens universitários, acusados de possuir maconha (crime grave durante a ditadura), embora reconhecendo expressamente a configuração do delito, para manter neles viva a esperança na misericórdia humana.
João Baptista Herkenhoff

João Baptista Herkenhoff

João Baptista Herkenhoff é juiz de Direito aposentado (ES), possui graduação em Direito pela Faculdade de Direito do Espírito Santo (1958), mestrado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1975) e livre docência na Ufes (1979). Pós doutorado em Wisconsin (1984) e na Universidade de Rouen (1992).

Atualmente é Coordenador Pedagógico do Curso de Direito da Faculdade Estácio de Sá no Espírito Santo e Professor Pesquisador da mesma instituição e m
inistra cursos de pequena duração sobre Direitos Humanos.
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