Artigos / Eduardo Gomes

04/05/16 às 00:19

De atemporal

Meu saudoso amigo e colega Evilázio Alves, companheiro de incontáveis andanças pelo nosso abençoado Mato Grosso, além de mestre na arte de fotografar era filósofo por natureza. Certa vez, referindo-se a cargos comissionados Evilázio citou uma frase lapidar da sabedoria popular, “Jabuti em cima de árvore é enchente ou mão de gente”.

O Gaeco acaba de deflagrar a Operação Rêmora lastreada em mandados expedidos pela juíza Selma Rosane de Arruda.

A ação desencadeada é de domínio público e, aparentemente, trata-se de mais uma operação irretocável, com a chancela da juíza que derrama luz sobre as trevas da corrupção nas entranhas do poder no nosso ensolarado Mato Grosso. Porém, há um aspecto que não pode ser desconsiderado nesse caso; melhor, nesse vergonhoso caso.

O Gaeco cita que teriam sido desviados mais de R$ 56 milhões da Secretaria de Educação de Mato Grosso (Seduc), em 23 obras de construção e reforma de escolas em Cuiabá, Várzea Grande e outras cidades, no ano passado. No entanto, não há referência ao montante global da contratação das construtoras.

Observem que esse fato teria acontecido em 2015, ano em que o governo de Pedro Taques fez bem pouco ou quase nada. Em suma, as 23 obras ora objeto de investigação formaram a espinha administrativa da Seduc.

O secretário de Educação é Permínio Pinto, figura pública muito conhecida pelos cargos comissionados e de vereador pelo PSDB, que exerceu em Cuiabá.

Permínio respondia e responde pela Seduc. Seu cargo exige uma figura que associe conhecimento do setor, habilidade política, boa gestão, honestidade e dedicação total. Pergunto onde estava Permínio quando a roubalheira aconteceu?

Permínio não é rainha da Inglaterra. Aqui, ele reina e governa.

Nessa condição Permínio tem que ser exonerado, com data da terça-feira, 3 de maio de 2016, quando Rêmora foi deflagrada. Cargo de secretário não é adereço nem penduricalho. Quem o exerce goza dos bônus e arca com o ônus.

É imperativa a exoneração de Permínio, que chegou ao cargo pelas asas do PSDB cuiabano representado pelo deputado estadual Wilson Santos e Thelma de Oliveira, com as bênçãos do presidente regional do partido, deputado federal Nilson Leitão. Sua nomeação foi partidária em nome da rateio do poder entre as siglas que ganharam a eleição ao governo. Esse mimo aconteceu quando Taques era filiado ao PDT.

Além da exoneração de Permínio, o governo tem que vir a público explicar quem é quem na engrenagem que teria desviado a montanha de dinheiro da Seduc, conforme nos diz o Gaeco.

Sem exagero, ninguém nos meios jornalísticos e políticos identifica entre as figuras de proa da Seduc os servidores Fábio Frigeri, Wander Luiz dos Reis e Moises Dias da Silva. Esses três personagens são apontados como os cabeças que movimentavam o tal esquema ora em apuração.

Quem nomeou Frigeri? Quem deu o cargo a Wander Luiz? Quem botou Dias da Silva na Seduc?

Invoco a filosofia que ouvi de Evilázio: Os três jabutis na árvore da Seduc ali chegaram pelas mãos de alguém, porque não há registro de enchente naquela secretaria.

Entendo que é preciso exonerar os três jabutis e dar satisfação a Mato Grosso sobre a nomeação deles.

Mesmo com a medida profilática da exoneração de Permínio (que espero acontecer) e a identificação e exoneração dos três jabutis não será fácil recuperar a dinheirama que o Gaeco diz ter sido desviada, mas quando nada veremos o ventre do governo Taques. Ventre tão cheio de apaniguados e apadrinhados como qualquer outro.

Não há castidade no governo Taques e ele não está acima do bem e do mal. Vejamos:

O escândalo começou em 2015 e somente em 13 de janeiro deste ano a secretária do Gabinete de Transparência e Combate à Corrupção do governo, Adriana Vandoni, informou à Delegacia Fazendária (Defaz) o que estaria aconteceu e pediu ao delegado Lindomar Tóffoli para instaurar inquérito sobre o caso.

Taques montou uma estrutura gigantesca pra Vandoni manter permanente big brother sobre os servidores, mas a reação da secretária demorou quase um ano.

O coronel da Polícia Militar, Airton Benedito Siqueira Júnior, foi apontado como envolvido na suposta compra superfaturada de um avião bimotor para o Estado, no governo anterior, de Silval Barbosa. Foi um escândalo, que passou pela investigação da Controladoria Geral do Estado. O oficial agora é chefe da Casa Militar de Taques. Quando o caso ganhou as manchetes, ele licenciou-se do cargo por cinco dias e depois reassumiu as funções.

O verdadeiro homem público não tem apego a cargo. O estadista bota os interesses do Estado acima de suas conveniências. Acredito que estamos carentes dessas duas figuras.

Sem tomar por exemplo, mas apenas para citação, volto a 2005, ano em que a Polícia Federal deflagrou a Operação Curupira. Policiais cumpriram mandado de prisão em desfavor do presidente da Fundação do Meio Ambiente (Fema) e ex-deputado estadual Moacir Pires. Não se tratava de prisão por corrupção ou suspeita de corrupção. Moacir foi pra trás das grades por conta da interpretação de uma lei mato-grossense que reconhecia a existência do bioma de transição do cerrado para floresta. Por conta disso, somente por isso, ele foi privado da liberdade. Imediatamente após a prisão o governador Blairo Maggi exonerou o integrante de seu governo. O empresário Jorge Pires de Miranda (da Concremax) e irmão de Moacir tentou por todos os meios que Blairo aceitasse pedido de exoneração do mano, mas Blairo foi irredutível.

Exonerar Permínio e dar o DNA das nomeações dos três jabutis é o mínimo que se espera nesse momento em que a prática de ontem se mistura com o agora; em que a linha imaginária que separa o moral do imoral se rompe; e que os fatos deixam o cidadão sem entender se o mandato de Silval acabou e o de Taques começou - como se vivêssemos num governo atemporal.
Eduardo Gomes

Eduardo Gomes

Eduardo Gomes é jornalista e escritor
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