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11/11/19 às 11:24

MPT em Mato Grosso realiza evento 'Perspectivas de Gênero, Raça e Diversidade e suas Interseccionalidades'

O MPT em Mato Grosso realizou na última segunda-feira, 4, no auditório de sua Sede, em Cuiabá, o evento "Perspectivas de Gênero, Raça e Diversidade e suas Interseccionalidades - Diálogo e Conscientização", com o objetivo de fomentar a integração, a conscientização e a atuação colaborativa, visando à máxima efetividade dos direitos sociais, em especial em seu âmbito interno.

O evento foi promovido pelo Comitê Gestor de Equidade de Gênero, Raça e Diversidade da PRT 23ª Região, com o apoio da Vice-Procuradoria Geral do Trabalho. As atividades foram organizadas e conduzidas pelo procurador Regional do Trabalho Alessandro Santos de Miranda.

Fizeram parte da mesa de abertura a vice-procuradora-geral do Trabalho, Maria Aparecida Gugel; o procurador-chefe do MPT-MT, Rafael Mondego, a juíza do Trabalho Deizimar Mendonça Oliveira, representando o Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT-MT); e o presidente da Comissão da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Mato Grosso (OAB-MT), o advogado Nelson Freitas Neto.

Em sua fala, o procurador-chefe do MPT-MT, Rafael Mondego, pontuou que o combate à discriminação é uma das metas prioritárias do MPT. “É importante registrar a relevância desse evento aqui no MPT porque nós estamos levantando uma de nossas bandeiras prioritárias, que é o combate à discriminação e a promoção da igualdade, da isonomia. Então, mais uma vez, agradeço a todos aqueles que compareceram: a OAB, Justiça do Trabalho, Ministério Público Estadual, a Superintendência Regional do Trabalho (SRTb) e todos os parceiros que se fazem presentes para que a gente possa levar adiante essa mensagem, que é muito válida”.

O presidente da Comissão da Diversidade Sexual da OAB, Nelson Freitas, externou a preocupação em relação aos índices de violência e discriminação da comunidade LGBTQI+. “Hoje sou presidente da Comissão da OAB, mas depois de muita luta. Sou formado, conheço os meus direitos, eu sei me impor em um ambiente. Mas e aquela mulher travesti lá do Pedra 90 que nem conseguiu se formar, que nem lembrada é? A gente já parou para pensar qual é a dificuldade dessa pessoa? E depois? Depois que eu entro dentro de uma empresa, quais são as políticas criadas para eu trabalhar nessa empresa? Porque, se eu for para pensar, os meus colegas vão refletir a sociedade, uma sociedade conservadora, preconceituosa, discriminatória”, disse.

A chefe de Gabinete da vice-PGT, procuradora Ludmila Reis Brito Lopes, a coordenadora do Comitê de Gênero da PRT 10ª Região, procuradora do Trabalho Vanessa Amaral de Carvalho, o superintendente Regional do Trabalho de Mato Grosso, Eduardo de Souza Maria, a auditora-fiscal Caroline de Almeida Mendes, e a vice-presidente da Comissão em Defesa da Igualdade Social da OAB-MT, Nayanne Cristina Ramos Souza, também marcaram presença no evento.

Desafios

A iniciativa faz parte de um projeto piloto que será implementado em todas as Regionais do MPT efetivando várias políticas institucionais de forma simultânea: a Política Nacional de Equidade de Gênero, Raça e Diversidade (Portaria PGT nº 1.220/2018); a Política Nacional de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral e Sexual e da Discriminação (Portaria PGT nº 583/2017); e a Política Nacional de Gestão de Pessoas (Portaria PGT nº 1.321/2018).

A vice-procuradora-geral do Trabalho, Maria Aparecida Gugel, ao se apresentar para procuradores, servidores, estagiários e terceirizados da PRT 23ª Região, trouxe reflexões sobre desafios que se mostram às instituições públicas para recepcionarem e adotarem práticas que incorporem, de fato, a perspectiva de gênero, raça e diversidade internamente. Segundo a vice-procuradora-geral, a instituição deve priorizar a resolução de problemas que atrapalhem o desenvolvimento humano e, por isso, a defesa do direito das minorias é fundamental.

Ela mencionou a preocupação do MPT em construir uma cultura organizacional pautada no respeito mútuo, na equidade de tratamento e na preservação da dignidade das pessoas. “Quando nós dizemos que o MPT tem uma Política de Gestão de Pessoas, uma Política de Saúde, uma Política de Equidade de Gênero, Raça e da Diversidade, uma Política de Enfrentamento ao Assédio Moral, Sexual e à Discriminação, isso significa dizer que a Administração se preocupa e quer sanar problemas existentes. E, portanto, com métodos, mecanismos, com programas e ações, nós vamos buscar entender estes problemas e estas questões e ter uma solução. Mais ainda, se nós temos hoje uma Política de Equidade de Raça e Diversidade no âmbito do MPT, isso significa que nós temos que nos preocupar imensamente em cumpri-la porque a nossa realidade interna tem que refletir a nossa atuação”.

A coordenadora nacional da Comissão de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral, Sexual e da Discriminação (CAMSD) do MPT, subprocuradora-geral do Trabalho Eliane Araque dos Santos, também participou do evento, tendo discorrido sobre organização do trabalho e sobre como é importante promover espaços de discussão coletiva e construtiva para melhorar os ambientes de trabalho e colaborar para o aprimoramento dos processos de trabalho.

“É na hora que a gente senta para conversar, dialogar, olhar um para o outro que a gente se solidariza, a gente se reconhece no outro, a gente entende o outro ou passa a entender e, com isso, criar a possibilidade de construir uma confiança. Se não houver diálogo vai haver o isolamento, a exclusão das pessoas que estão sofrendo o assédio e divisões no ambiente de trabalho, o que só vai gerar mais conflito.

Sobre a Política Nacional de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Moral, Sexual e Discriminação, explicou que a ideia é privilegiar o acolhimento, a escuta. “Em relação ao tema assédio moral e sexual, só posso dizer que tenho esperança que, e em algum momento, a gente vai conseguir realmente não ter atitudes discriminadoras, assediadoras, seja moral ou sexual, e para que isso seja possível, para que eu tenha essa esperança, é preciso que a gente comece a atuar no sentido de reconhecer que, efetivamente, aqui, entre nós há atitudes discriminadoras, assediadores. Para que eu possa falar de equidade, para que eu possa falar de uma política de gestão, eu preciso, antes de mais nada - e isso atravessa ambas as políticas no sentido de sua realização - ver que nós temos situações, relações e uma organização de trabalho que muitas vezes propicia o assédio, propicia a discriminação”.

Cultura do estupro 

Na sequência da programação, a promotora de Justiça do Ministério Público do Estado de Mato Grosso (MP-MT) e integrante do Movimento Nacional de Mulheres do Ministério Público, Solange Linhares Barbosa, ministrou a palestra “Mulher, Arquétipos e Estereótipos: uma Leitura do Feminino a partir dos Mitos”.

A promotora sustentou que há, hoje, um despertar para o fato de que as desigualdades de gênero são estruturantes e determinam a forma como a sociedade estabelece suas relações. Ela observou que, por meio de arquétipos - conceitos que representam o primeiro modelo ou antigas impressões sobre algo, propagam-se regras de como a mulher deve comportar-se em público e na presença dos homens.

Ela asseverou que os mitos, como de Penélope, a mulher que esperou por 10 anos o retorno de seu marido, Odisseu, da Guerra de Troia, e de Danaides, a obediente, circulam no meio social reforçando a ideia de que a mulher é um ser passivo, tolerante e amoroso. É também o caso da deusa da mitologia grega Ifigênia. “A gente atua no mundo sem saber que os arquétipos existem. Então Ifigênia é a mulher que se sacrifica pelo pai para que o destino aconteça, para que a guerra aconteça, e ela se coloca no altar e ali é sacrificada em nome da deusa Ártemis”, apontou Solange.

A promotora refletiu sobre o fato desses mitos serem reforçados até o ponto de transformarem-se em uma realidade aceita pela sociedade. “Queremos uma reflexão sobre a condição atual da humanidade. E nós estamos aqui e deste modo por quê? Nós fazemos julgamentos da nossa conduta e da conduta alheia de um modo ou de outro por quê? Uma das respostas é a existência de estruturas no inconsciente coletivo que determinam a forma como a gente vai atuar no mundo”.

Ainda, de acordo com o mito da Medusa, uma das personagens da mitologia grega mais famosas por seu cabelo de cobra e pelo poder de transformar qualquer um em pedra, teve seu destino selado quando Poseidon, deus dos mares e dos oceanos, a estuprou dentro do templo dedicado à Atena. Esta, por sua vez, indignada com o fim de sua castidade, puniu Medusa dando-lhe cobras no lugar do cabelo.

A promotora chamou a atenção para o fato de que, com o julgamento e culpabilização da mulher e a naturalização do comportamento do homem, permite-se o enraizamento da cultura do estupro. Nesse sentido, fica definido não somente como deve ser o bom comportamento feminino, mas também o que elas, não os homens, devem evitar para não atrair situações de violência.

“’O que elas eram? Elas já tinham tido namorados? Elas eram virgens?’ Estamos falando de estupro, para o qual existe uma capitulação legal. Você pratica o crime, incide na conduta e vai cumprir a pena. ‘Mas ela era virgem?’, perguntam. E eu lido diariamente com isso, a realidade da Promotoria de Justiça é essa: o preconceito. Quem faz a pergunta não sabe. Não é que seja uma pessoa má, é falta de instrução. Ela simplesmente não se deu conta de que há forças atuando na sua mente e que estão no inconsciente coletivo e fazem você agir de forma opressora e ruim para as pessoas”.

Experiências compartilhadas 

Durante o dia todo, o evento "Perspectivas de Gênero, Raça e Diversidade e suas Interseccionalidades - Diálogo e Conscientização" debateu os desafios enfrentados pelos povos indígenas, pela população negra, pela comunidade LGBTQI+ e pelas pessoas com deficiência para a superação de barreiras e estigmas.

Participaram Júlia Dias do Nascimento Coringa, Antonieta Luísa Costa, Eliane Xunakalo, Daniella Veyga Garcia e Juliana Segovia Moreira, que deram depoimentos sobre as suas lutas e dificuldades envolvendo questões de identidade de gênero, raça, etnia, orientação sexual e acessibilidade. Com histórias e trajetórias diferentes, as painelistas compartilharam experiências e emocionaram os presentes.

Exemplificando, em seu relato, Eliane Xunakalo, liderança indígena bakairi, afirmou que os povos originários vivem um momento especialmente difícil, mas que é preciso resistir e continuar lutando. “Uma vez ouvi algo que, para mim, foi uma ofensa. Me falaram ‘nossa, seu relatório está ótimo...para uma indígena’. Isso me feriu porque é como se o fato de eu ser indígena, eu não era capaz. Mas pelo contrário, eu sou indígena com muito orgulho. Nós somos capazes”.

Durante o dia todo, o evento "Perspectivas de Gênero, Raça e Diversidade e suas Interseccionalidades - Diálogo e Conscientização" debateu os desafios enfrentados pelos povos indígenas, pela população negra, pela comunidade LGBTQI+ e pelas pessoas com deficiência para a superação de barreiras e estigmas.

Em seu relato, Eliane Xunakalo, liderança indígena bakairi, afirmou que os povos originários vivem um momento especialmente difícil, mas que é preciso resistir e continuar lutando. “Uma vez ouvi algo que, para mim, foi uma ofensa. Me falaram ‘nossa, seu relatório está ótimo...para uma indígena’. Isso me feriu porque é como se, pelo fato de eu ser indígena, significasse que eu não era capaz. Mas pelo contrário, eu sou indígena com muito orgulho. Nós somos capazes”.

Censo

Antes da realização do evento foi realizado o 1º Censo interno visando à demonstração da demografia institucional no contexto de representatividade de gênero, raça/etnia, pessoas com deficiência ou reabilitadas e LGBTQI+.

Além disso, foi oportunizada a todos a participação em Espaços de Discussão onde foi possível a discussão sobre os aprendizados e experiências. Ainda, ao final, cada grupo apresentou propostas que compuseram a Carta de Promoção de Equidade de Gênero, Raça e Diversidade da Procuradoria Regional do Trabalho da 23ª Região – MT, com proposições para melhoria do ambiente de trabalho e a promoção da igualdade e da diversidade no âmbito da Regional.
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