Deu na Folha - Governo de MT ocultou dados de exploração ilegal de madeira
Um relatório mantido oculto pelo governo de Mato Grosso estima que 61,7% da exploração da madeira no estado ocorre em áreas não autorizadas.
O estudo leva em conta o período compreendido entre junho de 2014 e outubro de 2015. Em comparação com o levantamento anterior (2013/2014), a área de exploração ilegal cresceu 27%.
A maior parte desse período se refere ao atual governo Pedro Taques (PSDB), que tomou posse em janeiro de 2015. Trata-se do número oficial mais recente sobre exploração ilegal de madeira —após atrasos, a Sema (Secretaria de Estado de Meio Ambiente) promete um novo relatório no final de maio.
Os percentuais são calculados a partir de imagens de satélite que identificam a atividade madeireira. Em seguida, essas imagens são contrastadas com áreas onde a exploração florestal é permitida. Ao todo, foram mapeados 287.336 hectares, o equivalente a quase dois municípios de São Paulo.
Desde março de 2017, o relatório está disponível em um link dentro do site da Sema (Secretaria de Estado de Meio Ambiente), mas o governo de Mato Grosso não deu nenhuma publicidade ao estudo — desconhecido até semanas atrás por pessoas que acompanham o setor— nem o citou quando foi questionado sobre dados de exploração ilegal.
O diagnóstico oficial se mostra mais sombrio do que um estudo do Instituto Centro de Vida (ICV) divulgado em meados de fevereiro, quando foi tema de reportagem da Folhae recebeu críticas do governo Taques.
Usando uma metodologia semelhante, a ONG calculou que 41% da exploração de madeira em Mato Grosso, entre agosto de 2013 e julho de 2016, ocorreu em áreas não autorizadas.
Entre agosto de 2014 e julho de 2015, o período mais próximo ao estudo do governo, o ICV estimou em 43% o percentual de ilegalidade.
Coautor do estudo do ICV, Vinicius Silgueiro afirma que a discrepância se deve à periodização maior do relatório oficial. "Esses cinco meses de diferença, justamente nos meses de seca, o auge do período exploratório da madeira, representam muito em termos de área explorada", diz.
Reação
Apesar da projeção menor de ilegalidade, o estudo do ICV foi rechaçado pelo governo de Mato Grosso. Em nota enviada à Folha na época, a Sema contestou o relatório ao afirmar que a ilegalidade no setor madeireiro está em queda, embora os números oficiais disponíveis demonstrem o contrário.
A Sema não mencionou a existência do estudo oficial sobre madeira, mas citou dados sobre a queda no desmatamento. A exploração madeireira, porém, não é medida dessa forma, já que é feita por meio de corte seletivo, e não pela erradicação de toda a floresta.
Outro lado
Questionada sobre a ausência dos números oficiais sobre a atividade na resposta, a Sema afirmou: "Nos ativemos a responder aos questionamentos feitos pelo jornalista sobre os dados do estudo em debate. Em nossa nota, discutimos justamente o que aconteceu no passado e o que vem sendo feito pela gestão desde 2015 para aperfeiçoar os processos, diminuindo as ilegalidades em todos os setores de utilização dos recursos naturais".
Sobre o fato de não ter dado publicidade aos números de madeira ilegal no ano passado, a Sema se limitou a dizer que fez ampla divulgação de informações relativas à pasta e que "a transparência na divulgação das informações vem sendo aprimorada e impulsionada a cada dia".
Sem apresentar números, a Sema novamente afirmou que a ilegalidade está em queda e que agora quer unificar sua metodologia com a do ICV. "Não há má-fé, há ciência, engenharia e métodos que realizam as análises", afirma a nota.
O estudo e a reportagem da Folhatambém foram questionados pelo vice-governador e ex-secretário de Meio Ambiente Carlos Fávaro (PSD). Ele renunciou ao mandato no último dia 5 para disputar uma vaga no Senado ou se lançar a governador.
Em carta ao jornal publicada em fevereiro, Fávaro disse que a reportagem omitiu dados enviados pela Sema e afirmou que, sob sua gestão (2016-2017), houve um aumento de autuações ambientais, mas tampouco citou os dados oficiais sobre a exploração ilegal de madeira.
Questionado sobre por que não mencionou o relatório oficial sobre madeira ilegal concluído em sua gestão, Fávaro informou, via assessoria de imprensa, que os dados são anteriores à sua época como secretário de Meio Ambiente.
MADEIRA ILEGAL Dados do governo são ainda maiores do que os de ONG, publicados em fevereiro
1) O que diz o relatório do governo de Mato Grosso
Entre junho de 2014 e outubro de 2015, 177,3 mil hectares foram explorados ilegalmente —61,70% de toda a exploração no estado.
Em comparação com o levantamento anterior (2013/2014), a área de exploração ilegal cresceu 27%
Ao todo, foram mapeados 287.336 hectares, o equivalente a quase dois municípios de São Paulo.
2) O que dizia um estudo do Instituto Centro de Vida (ICV) divulgado em fevereiro
Entre agosto de 2013 e julho de 2016, 195,6 mil hectares foram explorados ilegalmente —41% da exploração no estado.
Ao todo, foram mapeados 476,7 mil hectares.
3) O que diz o governo
Sobre o estudo do ICV, em fevereiro, contestou os dados e afirmou que tinha atuação robusta contra a exploração ilegal, mas não apresentou os dados oficiais, com exploração ilegal ainda maior.
Sobre o relatório, disse que a ilegalidade está em queda. O ex-secretário de Meio Ambiente Carlos Fávaro (PSD), que havia questionado o estudo do ICV, afirmou que os dados são anteriores à sua época à frente da pasta.