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05/02/20 às 08:33

Dado como morto, homem reencontra os sete filhos e tenta recuperar tempo perdido

Há cinco anos, o lavador de carros do Palácio Paiaguás chegou em casa e sua família havia desaparecido

Lidiane Barros, O Livre

AguaBoaNews

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Dado como morto, homem reencontra os sete filhos e tenta recuperar tempo perdido

O celular agora o mantém conectado aos filhos; A filha mais velha o atualiza o dia todo

Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre

Desde o dia 24 de janeiro, o celular com a tela trincada, que vez ou outra era utilizado para fazer e receber chamadas, já não sai das suas mãos. Exceto, quando tem que focar no trabalho.

O homem que há mais de 40 anos lava carros no Centro Político Administrativo de Cuiabá teve que se habituar rapidamente às conversas via WhatsApp, que além de texto e áudios, incluem vídeo-chamadas.

É que só agora, depois de cinco anos, Antônio Francisco de Araújo Nunes, 52, enfim, descobriu o paradeiro de sete filhos desaparecidos.

Desde então, troca mensagens o dia todo com a filha Verônica, de 19 anos. Ela o informa sobre os irmãos, que assim como ela, acreditavam que o pai estava morto.


É preciso fazer força para visualizar as imagens na tela trincada: o reencontro resolverá! (Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

“Quando cheguei do trabalho, não tinha ninguém em casa. Nem a mulher, nem os filhos. Roupas, documentos… estava tudo lá. Pensei: ‘foram dar uma volta’”.
 
O cachorro latiu quando era de noite, mas não era sinal de que estavam chegando. “Passou um dia, dois, três. Fui ficando desolado. Procurei em hospital, delegacia, ninguém sabia deles”.

Segundo Antônio, a angústia abriu terreno para um período obscuro. “Sem notícia alguma, comecei a beber demais, era muito desespero”. Logo, encontrou certo equilíbrio na igreja.

Porta do Carumbé

“E um dia o pastor disse que quem quisesse receber uma bênção tinha que levantar a mão, daí ele foi pedindo para um ou outro ir abaixando os braços, até que só sobrou eu. Fui à frente para receber a bênção. E ele me disse: ‘não se desespere, Deus vai abrir uma porta para você’”.

No dia seguinte, uma segunda-feira, Antônio deixou o carro em uma autoelétrica na Avenida dos Trabalhadores e pediu a moto emprestada a um amigo, porque precisava pegar R$ 100 de um cliente.

Toninho, como é conhecido, foi parado pela polícia que lhe informou que a moto era roubada. “A tal porta era do Carumbé”.
 

E Toninho mal esperava o que ainda estava por vir depois dos dias na cadeia (Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)
 
“Depois de ser solto, voltei na igreja e dei meu testemunho. O pastor disse que, se Deus havia me colocado lá dentro, era porque estava me protegendo de algo durante os três dias que fiquei preso, sem dever nada. Aí me desiludi com a igreja”.
 
Os R$ 100 que havia recebido e com os quais fora preso, foram devolvidos há pouco. “Estou esperando sair a sentença, porque penso em pedir indenização por danos morais”.

Bebida da encruzilhada

Se já não bastasse a sucessão de tensos momentos, quando chegou em casa, depois dos três dias em que ficou preso, ao abrir a porta, Antônio encontrou o cachorro morto.

Diante do episódio inesperado (a prisão), o cão ficou sem comer e beber água.

“Eu desisti da igreja, né? Mas eu fui fraco, porque Deus me provou e, ao invés de continuar firme, abandonei tudo”.

E quando ele se pega pensando porque sua vida, que incluía um casamento de 16 anos acabou desandando, só vem um episódio à mente de Antônio.

“Era um dia de Natal. Passei por uma encruzilhada em que havia uma oferenda com pinga, champanhe e fumo. Eu não acreditava nessas coisas. Tomei um gole da pinga, a mulher colocou a champanhe na geladeira e a dividimos. Depois disso, minha vida virou de cabeça para baixo. Passamos a brigar muito”.
 
Lar em desequilíbrio

Em êxtase por ter reencontrado o pai, Verônica diz que a mãe a levou com os irmãos, justamente porque os dois passaram a brigar demais.

“Passamos um ano em uma Casa de Amparo de Cuiabá, até que ela juntou dinheiro e viemos parar em Barra do Garças. Ela nos dizia que nosso pai havia sido assassinado, mas eu sempre tive fé que ele estivesse vivo”.

Em suas memórias, Verônica está com um pai afetuoso, mesmo que a relação entre ele e sua mãe tivesse se tornado insustentável.

Ela foi acionada por uma prima, por parte do pai. Toninho conta que estava em casa, quando a moça chegou e disse “tio, você não vai acreditar”. Rapidamente, ela mostrou a tela do celular, enquanto Verônica se emocionava com a imagem dele na tela do outro lado.

Do outro lado da linha, Toninho descobriu que sua família havia crescido (Foto: Marcello Casal Jr./Arquivo/Agência Brasil)
 
Primeiro neto
 
“Eu perguntei à minha sobrinha quem era aquela moça chorando e a Verônica respondeu: ‘sou eu pai, sua filha’”.
 
Ao lado dela, estava o primeiro neto de Toninho. “Foi emocionante saber que já sou avô. Ele me disse ‘bença, vô’. Choramos todos”, diz com os olhos marejados.

Emocionado, ele diz que só pensa em uma coisa: no reencontro com os filhos.

“Queria muito ir vê-los, mas lá na casa da Verônica, já que a mãe deles já constituiu uma outra família.

Não quero atrapalhar, não quero causar mal-estar. Só quero ver os meus filhos”.

Além de Verônica, estão à sua espera, duas crianças de 6 e 8 anos e quatro adolescentes, de 13, 14, 15 e 16. Um deles nasceu prematuro e uma paralisia o fez dependente de uma cadeira de rodas.

“Eu quero poder cuidar do meu filho ‘especial’”, ressalta o pai.

“Desde que ele era pequeno, para ir à escola, eu o levava lá da chácara onde morávamos no Recanto Seriema, perto do Belvedere, até o Altos da Serra. Percorríamos uns 6 km. Eu ia empurrando sua cadeira de rodas”.

A irmã reforça que o jovem precisa dar continuidade ao tratamento.

“Ele precisa de uma botinha ortopédica, cadeira de rodas e de fazer equiterapia. Se não for, até os 24 anos pode ser que ele não ande mais”, disse, acreditando que o pai, morando em uma cidade grande, teria mais condições de ajudar seu irmão.
 
Descoberta pelo Facebook


Desde que descobriu o paradeiro dos filhos Toninho mal dorme de tanta ansiedade (Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre).
 
Foram amigos e clientes que ajudaram Toninho a localizar a família.
 
“Um amigo da Seplan [Secretaria de Estado de Planejamento] achou a Verônica pelo Facebook. Foi então que conseguimos dois números, mas eu nunca conseguia. Daí meu filho e minha nora passaram a me ajudar, me ajudando a mexer com o celular”, sorri.

Toninho tem mais dois filhos de um primeiro casamento.

Verônica conta que foi uma surpresa ter recebido notícias do pai.

“Eu já o havia procurado nas redes sociais, Defensoria. Daí meu marido disse que tinham entrado em contato com ele, dizendo que meu pai estava vivo. Mas ele me alertou que poderia ser um trote. Pensei forte que era chegada a vez de reencontrar meu pai e o melhor, que ele não estava morto”, diz a moça.

“Todo o dia dos pais, nos meus aniversários… eu sempre sonhava, desejava a presença dele. Eu sabia que ele estava vivo”.

E ele reforça: “eu nunca parei de procurá-los”.

Pedido de ajuda

Como Toninho possui baixa renda, ele está em busca de todo apoio para viajar até Barra do Garças para reencontrar os filhos.
 
Pensou em vender a moto, mas a filha pediu que ele tenha paciência, pois esse é o maior bem do lavador de carros que, hoje, vive de favor na casa de um sobrinho, localizada nos arredores de onde morava com a família, no Recanto do Seriema.

“Eu não estou dormindo direito. Eu só fico pensando no dia em que vamos todos nos abraçar, sorrir, comer um churrasquinho. Queria muito dar um momento desses para eles. Assar uma carne. Dar um presente para cada um e, claro, arrumar uma roupinha bonita para encontrá-los. Mas também preciso de ajuda para as passagens”.

Se você puder ajudar, entre em contato pelo telefone: (65) 99223-7690.

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