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12/06/18 às 14:47

Como a Fujifilm sobreviveu à era digital

Antes uma gigante dos filmes fotográficos, a empresa encontrou novas aplicações para suas tecnologias no mercado de cosméticos e nos planos de saúde

Débora Ramos

AguaBoaNews

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Como cientista da gigante japonesa Fujifilm, Tomoko Tashiro foi designada para desenvolver uma tecnologia de papel fotográfico colorido, mas quando retornou ao trabalho depois de dar a luz, em 2005, ela teve uma grande surpresa quando seu chefe lhe perguntou se ela toparia se aventurar no setor de cosméticos da mesma empresa.
 
"Eu fiquei em choque. Estava insegura se o projeto poderia ser realizado ou não", disse ela à revista Channel New Asia. "Todo mundo estava preocupado pensando em como uma empresa de tecnologia podia aplicá-la no campo dos cosméticos", completou.
 
Hoje, o mercado de cosméticos e os cuidados de saúde são as divisões mais lucrativas da Fujifilm, contribuindo com mais de US$ 3,4 bilhões de receitas anuais. O desejo de fazer mudanças drásticas e de adaptar-se rapidamente às transformações do mercado é o que manteve a empresa - outrora uma gigante do mercado de filmes fotográficos e de revelação de fotos no mundo - viva e próspera quando a era digital chegou para valer - e que levou a rival Kodak à bancarrota.
 
Fundada em 1934, por décadas a empresa desfrutou de um quase monopólio do mercado de filmes fotográficos no Japão. Quando a primeira onda de digitalização chegou, nos anos 1980, foi sentida apenas nos mercados de negócios. A Fujifilm pareceu estar adiante da curva provendo raios-X digitais aos hospitais.
 
O presidente e CEO da Fujifilm, Shigetaka Komori, diz que a empresa decidiu não rejeitar as tecnologias digitais, apesar de considerá-las um "canibalismo". "Nós comeríamos nossa própria divisão analógica", contou à Channel New Asia. Ele segue: "Se nós não fizessemos isso, alguém faria. Foi por isso que decidimos entrar no digital e nos tornar um player nesse ramo".
 
Em 1988, a empresa lançou a primeira câmera fotográfica totalmente digital, batizada de FujiX. Podia arquivar de cinco a 10 fotografias em um cartão de memória e alcançar até 1.1 megapixels de resolução. Mas era cara mesmo para os padrões japoneses: custava mais de US$ 10 mil (R$ 37 mil, na cotação de junho), o que a acabou reduzindo aos profissionais e à indústria de comunicações, como jornais e revistas.
 
A empresa seguiu sem sobressaltos, mas não vivia ainda a era completamente digital. Incrivelmente, o mercado de filmes fotográficos continuou a crescer até o início dos anos 2000. Em 2001, por exemplo, dois terços dos lucros da Fuji vinham das vendas dos rolos de fotos no seu país de origem. À época, ela chegou a abandonar suas aventuras, mesmo tendo sido a pioneira no projeto de câmeras digitais.
 
A empresa sentiu que a imagem impressa sobreviveria e investiu milhões em um novo produto, a Instax Mini, uma câmera analógica que permitia que as fotos fossem impressas segundos depois de clicadas. Em 2002, de acordo com a própria Fuji, a máquina vendeu ao menos 1 milhão de unidades pelo mundo.
 
Porém, a era digital viria para valer no ano seguinte - e a Fujifilm foi atingida fortemente. As vendas de filmes caíram um terço em menos de um ano. Em apenas seis meses, as lojas foram de quase 5 mil rolos fotográficos por dia para menos de 1 mil. Um mercado que significava o grosso dos lucros desapareceu em um piscar de olhos. "Eu acreditei que o filme colorido não desapareceria facilmente, mas a onda digital destruiu tudo em instantes", revelou Komori.
 
Anos depois, com a chegada dos celulares, a revolução chegou de fato à fotografia. Mais baratas e rápidas, além de compartilháveis em redes sociais como o Facebook e o Instagram, as fotografias digitais fizeram com que o filme se tornasse quase obsoleto. Num primeiro momento, as reações foram ruins: a Fujifilm tomou a decisão de cortar 5 mil empregos em suas fábricas de rolos fotográficos e cortou mais de US$ 5 bilhões (R$ 40 b bilhões) em custos de produção, ao mesmo tempo em que iniciou uma batalha em busca de novas fontes de receitas.
 
A solução, segundo Komori, seria um plano revolucionário de diversificar os mercados atendidos pela Fujifilm em áreas como a farmacêutica, a cosmética e a de saúde. Elas pareciam completamente incongruentes com a fotografia, mas a empresa sempre soube que suas tecnologias tinham potencial de aplicação para além do ramo das fotos.
 
A empresa tinha acumulado cerca de 20 mil componentes químicos em quase um século de pesquisas. Todos eram originalmente desenvolvidos para filmes fotográficos, mas agora poderiam ser ingredientes para a nova divisão farmacêutica da Fuji.
 
Na parte de cosméticos, a empresa usou os mesmos processos e componentes químicos que foram criados para evitar a descoloração das fotos nos papéis para aplicação na pele - prevenindo da flacidez ao desbotamento. Logo, a empresa desenvolveu drogas para combater câncer e doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer e outras enfermidades infecciosas.
 
Hoje, os filmes fotográficos contam por 1% das receitas da empresa - eram 70% no passado. Komori, no entanto, acredita que a empresa deve sempre proteger a cultura fotográfica e mantê-la viva.
 
"A humanidade não pode viver sem a foto", disse ao Channel New Asia. "Nós não fazemos nenhum dinheiro com ele, mas vamos manter a produção de filme colorido. Não importa o que, nós não vamos desistir nunca da fotografia", finalizou.

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