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02/09/15 às 07:57

Obstetra:Parto normal ou Cesariana?

É comum a divulgação da etimologia popular (pseudoetimologia) segundo a qual a palavra cesariana derivaria da forma como nasceu o ditador Júlio César. Segundo João Malalas, a mãe de Júlio César morreu no nono mês de gravidez, e sua barriga foi cortada; daí que ele recebeu o nome de César que quer dizer cortar na língua dos romanos. Hoje, a cesariana é a cirurgia mais comumente realizada em todo o mundo.

"Com 35 anos de experiência, vi o número de cesarianas crescer de forma significativa nos últimos 10 anos. Precisamos estar atentos a isso, para garantir que ela seja realizada em mulheres que precisam da cirurgia, mas que não haja um abuso", diz Marleen Temmerman, diretora do departamento de saúde reprodutiva da OMS.

Em 2014 a taxa de cesarianas em Portugal foi de 33%. Nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde realizaram cesarianas em 28% dos casos, nos privados em 2012 (último ano em relação ao qual há números oficiais), foi realizada cesariana em 66% dos partos.

No Brasil, em 2013 57% dos mais de 2,9 milhões de bebês no Brasil nasceram por meio da cesariana. Esta taxa vem crescendo há mais de 20 anos, confirmando a liderança mundial em partos cesáreos. Ela é principalmente atribuída ao alta índice nas instituições particulares e superior à soma do percentual das cesarianas desejadas pelas parturientes e dos casos medicamente necessários.

Atualmente, mais da metade dos bebês brasileiros nascem desta forma - um índice que chega a 84,6% na rede particular -, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). O órgão recomenda que a taxa fique entre 10% e 15% dos partos.

Em países como os Estados Unidos, em que erros médicos podem levar a indenizações milionárias, o medo de ser responsabilizado legalmente caso algo saia errado com o parto normal faz com que médicos tendam para o parto cirúrgico.

O recado das páginas da Lancet assume um significado particular para a América Latina e, em especial, para o Brasil, segundo colocado em realização de partos cesáreos no mundo – uma das principais questões relacionadas à saúde reprodutiva da mulher no país, ao lado da esterilização cirúrgica e da retirada desnecessária do útero (histerectomia). Aqui os índices de partos cirúrgicos insistem em se manter escandalosamente elevados desde a década de 1980, sobretudo entre as mulheres de classe média e alta. Atualmente quatro de cada dez crianças nascem por meio de cesarianas, na maioria das vezes agendadas pelas mães e pelos obstetras bem antes do final da gestação – uma proporção exagerada, duas vezes e meia maior que o índice de 15% aceito pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

"A mensagem enviada pela comunidade médica é que a cesariana é uma forma de parto mais moderna e higiênica, enquanto o parto normal é feio, primitivo e sujo", diz Simone Diniz, do departamento de saúde pública da Universidade de São Paulo (USP).

O “ouro” do Brasil é responsabilidade de médicos, gestantes e do sistema hospitalar. Para o obstetra Carlos Eduardo Czeresnia, do Hospital Albert Einstein, médicos indicam a cirurgia por medo de processos: a cesárea tornaria o obstetra mais defensável se algo desse errado, por ele se ater a rígidos procedimentos operatórios. “Por isso, o médico começa a criar medos na cabeça da gestante, dá razões esdrúxulas para fazer uma cesárea”, afirma.

Além disso, é mais prático para ambas as partes fazer uma cirurgia de uma hora do que dedicar 12 horas a um trabalho de parto – pelo qual, aliás, o médico recebe menos –, cancelando um dia inteiro de consultas. Por fim, muitas gestantes veem na cirurgia menos dor e mais segurança.

Na outra ponta deste cenário, países africanos, como Niger, Etiópia e Burkina Faso, registram menos de 2% dos partos realizados por meio de cirurgia. Isso está relacionado ao acesso precário a um sistema de saúde adequado.

Entre os países com o nível desejado de 15% de cesarianas, encontra-se a Holanda, onde a tendência crescente de partos realizados em casa, com uma abordagem mais natural, sem anestesia e com o apoio de parteiras em vez de médicos, provou-se uma boa forma de conter o aumento dos partos cirúrgicos, apontam especialistas.

Hoje, cerca de 65% dos partos feitos no país ocorrem em casa, o que faz com que a incidência de cesáreas eletivas seja bem pequena.

A atenção humanizada ao parto e nascimento é fundamentada na importância do fortalecimento do protagonismo e da autonomia da mulher neste momento. Este modelo de parto incentiva a participação da gestante nas decisões referentes às condutas, protege a mulher contra violência ou negligência, reconhece os direitos fundamentais de mulheres e crianças a tecnologias apropriadas de atenção em saúde, com a adoção de práticas baseadas em evidências, e garante o direito à acompanhante de livre escolha. 

Não basta falar em reduzir cesarianas. Nós precisamos ter partos prazerosos, com acolhimento, respeito, com as pessoas que você gosta próximas, a lei do acompanhante sendo respeitada, sem intervenções, com a possibilidade de andar livremente, se alimentar, que as pessoas expliquem o que está acontecendo, que é o que não costuma acontecer.

As mulheres ficam isoladas, em leitos, sofrendo dores, não podendo fazer barulho, sob pena de sofrerem represálias, sem poder comer, sem poder andar. É muito difícil. Sem contar as questões físicas mesmo, não exatamente do parto, mas as intervenções que são feitas.

. “A questão do parto é um problema político porque há médicos e enfermeiras legalmente habilitados para executar essa função”, diz Santos, “e agora novamente haverá parteiras”. A solução certamente não é única, nem virá em pouco tempo.

E para você? Parto Normal ou Cesariana?
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