Artigos / Suelme Evangelista Fernandes

16/03/18 às 08:16

A castanha do Brasil e oportunidades em Mato Grosso

Foto: Gcom

O modelo de ocupação do solo na região noroeste de Mato Grosso é predominantemente de agricultura familiar com até quatro módulos fiscais, algo em torno de 400 hectares no máximo, e uma possibilidade de exploração da área de ate 20% conforme o novo código florestal.

Por essas razões tornou-se praticamente inviável o desenvolvimento da agricultura de larga escala, abrindo espaço para novas formas de produção sustentável como a agroecologia e os sistemas agrossilvipastoril e sociobiodiversidade.

O uso sustentável dos recursos naturais, principalmente os amazônicos, são importantes não só por contribuir para a regularização de chuvas locais e/ou regionais, sequestro de carbono e redução do efeito estufa, mas também pela grande oferta de produtos que servem para a alimentação humana, bem como para estudos biotecnológicos.

Potanto, existem muitas possibilidades de se produzir de maneira sustentável neste bioma, com plantações perenes frutíferas ou nativas de alto valor agregado para o mercado, baixa emissão de carbono e que servem como estratégia de recuperação de área degradada ou de pastagem, o denominado sistema agroflorestal. Citamos aqui algumas possibilidades de produção sustentável como a pupunha, babaçu e o seu palmito, açaí, cupuaçu, café, seringa, castanha do Brasil, guaraná, cacau entre outros.

A Ceplac- Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira - que atuou até 2013 no estado e a Embrapa Agrossilvipastoril de Mato Grosso, localizada em Sinop, têm buscado inovações tecnológicas sustentáveis para os sistemas integrados de produção agropecuária.

Várias ONG’s há muito tempo atuam nesta direção e citarei como exemplo, o ICV (Instituto Centro Vida), que em 2017 aprovou o projeto Valorizando Cadeias Socioprodutivas Amazônicas, financiado pelo Fundo Amazônia no valor de R$ 16 milhões e que irá trabalhar em seis cadeias produtivas, sendo elas: leite, castanha do Brasil, babaçu, hortifrutigranjeiros, café e cacau nas cidades de Alta Floresta, Colniza, Cotriguaçu e Nova Bandeirantes.

Outra instituição pública internacional atuante é o Escritório Nacional das Florestas (Office National des Forêts – ONF da França), que criou uma correspondente no Brasil, a  ONF-Brasil para administrar os projetos desenvolvidos na Fazenda São Nicolau em Cotriguaçu que está dividido em cinco programas: Biodiversidade, Carbono, Floresta Nativa, Integração Local e Reflorestamento.

Por mais que essas grandes agências nacionais e internacionais de pesquisa, transferência de tecnologia e ONG’s tenham realizado inúmeras experiências, de fato mesmo, o poder público estadual seja via Secretaria de Estado de Agricultura Familiar, Empaer ou os municípios através das secretarias municipais de agricultura, pouco exploraram estes potenciais produtivos. Até houveram iniciativas, contudo bastante modestas, paliativas e pontuais.

Pra ilustrar nosso potencial, falarei um pouco sobre a produção de castanha do Brasil, tanto manejada quanto extrativista, pois Mato Grosso é o 3º maior produtor de castanha do país, chegando a produzir até 500 toneladas por safra.

Nas iniciativas de manejo, duas experiências se destacam; Uma no município de Apiacás que saiu na frente com a produção de 30 mil mudas de castanha em viveiro público que serão distribuídas para pequenos produtores. A outra em Castanheira, que, apesar do nome do município, possui praticamente só uma árvore da espécie na entrada da cidade, porém iniciou-se ali um bom programa para replantio das castanheiras precoces como estratégia de reflorestamento. Estas mudas precoces desenvolvidas na Embrapa de Manaus, com até cinco anos já produzem o ouriço e sua colheita é mais simplificada pois a espécie não alcança uma altura muito elevada.

Em relação à extração nativa e comercialização, a região noroeste possui pelo menos cinco grandes inciativas de compra e industrialização de castanha voltados ao mercado internacional: nos municípios de Juruena, a Coopavam -  Cooperativa dos Agricultores do Vale do Amanhacer que fica dentro de um assentamento de mesmo nome e Associação Cantinho da Amazônia; Apiacás Arapama - Associação Regional de Apicultores da Amazônia Apiacaense, Colniza no Guariba Comigua - Cooperativa Mista de Guariba e outra empresa  privada de Alta Floresta, a Castanhaf.

Todas elas possuem um variado mix de produtos que vão da castanha in natura a muitos subprodutos como óleos, barras de cereais, farinha, bolachas, doces entre outros. Um exemplo é o da Coopavam que já vende para fábrica de cosméticos ‘Natura’ grandes quantidades de óleo extraído e tem na relação de empregos diretos, aproximadamente, 100 pessoas e indiretos 400 coletores de castanha. No geral, os empregos indiretos são formados pelos extrativistas índios e produtores familiares que exploram reservas de extrativismo como a Guariba-Roosevelt  , áreas de assentamentos e áreas privadas.

Existem também diversas associações de coletores como a do P.A Projeto de Assentamento Cotriguaçu, do P.A Keno em Cláudia e dos índios Zoró em Rondolândia. Estas duas primeiras exploram castanha em reservas legais de áreas privadas com a permissão de fazendeiros, e já estamos organizando esta atividade através da lei que regulamentará a exploração de produtos vegetais não madeireiros por meio da Sema-MT.

Lembrando que o quilo da castanha no ano passado chegou a R$ 100 (beneficiada), em tese esta atividade gera em MT cerca de R$ 50 milhões por ano na economia verde da floresta e dos municípios, além de ser uma alternativa absolutamente sustentável do ponto de vista ambiental, social e econômico.

Este painel se dedicou a apenas um ativo da floresta amazônica mato-grossense, a castanha do Brasil, que pode crescer ainda muito em produção, pelo fato de que já existem pelo menos cinco empresas especializadas atuando nesta cadeia. O desafio do Estado é de investirmos mais em pesquisa, em novas tecnologias produtivas e tratos culturais; na infraestrutura de produção e do escoamento; na legislação fiscal e ambiental, além do fortalecimento das iniciativas de reflorestamento e plantio de mudas precoces nos municípios, com estruturação de viveiros, distribuição de mudas e um amplo programa de manejo e exploração sustentável de castanha do Brasil em MT. Isso poderá fortalecer as pequenas cadeias produtivas e contribuir para que esses produtos sejam beneficiados no estado, gerando ainda mais renda para os produtores familiares.

O Governo de Mato Grosso pelo fato de possuir amplo diálogo com as instituições ambientais e produtores, tem trazido oportunidades novas de geração de emprego e renda para os municípios, tratando nosso patrimônio vegetal como bem indispensável para captação de investimentos internacionais e não como estorvo do desenvolvimento socioprodutivo. Esta mudança de atitude e rumo traz uma luz para as cidades do norte/noroeste mato-grossense e a agenda ambiental do planeta.
Suelme Evangelista Fernandes

Suelme Evangelista Fernandes

Suelme Fernandes é secretário de Agricultura Familiar e Assuntos Fundiários de Mato Grosso
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