Artigos / Juacy da Silva

16/02/17 às 18:46

FORO PRIVILEGIADO E IMPUNIDADE (I)

Antes de entrar diretamente neste importante e controvertido assunto para o combate `a  corrupção e o aperfeiçoamento de nosso regime semi democrático, gostaria de chamar a atenção dos leitores, eleitores, contrribuintes, cidadãos  e cidadãs em  geral para  tres estorinhas já bem  conhecidas da opinião pública.
 
A primeira estória é a do lobo e o cordeiro, quando o lobo ao “dialogar”  com o cordeiro, querendo  devorá-lo, não sem antes demonstrar que o mesmo era o culpado por sujar sua água, apesar de o cordeiro estar a jusante, ou seja, rio abaixo, sendo impossível sujar á agua do lobo  este invocou a vida passada do cordeiro e disse que se ele não estava sujando a água, seus  pais ou antepassados haviam poluido a água do Rio. Resumindo, independente da racionalidade ou da situação o lobo sempre encontra  uma justificativa para comer o cordeiro.
 
A segunda  estorinha é a da raposa e das galinhas. Ao se verem devoradas pelas raposas que agiam impunemente as galinhas se reuniram em asssembléia geral  e decidiram reforçar a segurança do galinheiro e aí apareceu uma raposa bem esperta e se prontificou a tomar conta do galinheiro para que outras raposas não viessem ameaçar a vida das galinhas. Resultado, as galinhas elegeram tal raposa boazinha e no dia seguinte não havia nenhuma galinha e todas haviam sido comidas pela raposa guardiã  e outras que com ela haviam participado da trama.
 
A outra estorinha é a do vampiro e o banco de sangue. Segue a mesma lógica, como  o estoque de sangue estava acabando, os gestores do banco de sangue resolveram escolher um vampiro mor, que era o melhor conhecedor da área, ou seja, de sangue, para modernizar o banco de sangue e assim garantir sangue para quem dele precisasse. Resultado, rapidinho os estoques de sangue acabaram e , advinha  quem  bebeu todo o sangue que ainda havia no banco, com certeza o morcegão.
 
Assim também acontece nas sociedades que são constituidas por classes, castas, estamentos, categorias e grupos de interesse. Geralmente  pensamos que em uma democracia e em uma república, o povo, ou seja, os eleitores são a verdadeira fonte do poder e que, principalmente os “nossos”  representantes eleitos para os poderes  executivo e legislativo, ao pedirem os votos de milhares ou milhões de eleitores ao serem eleitos irão defender os interesses, as aspirações e as necessidades do povo, principalmente das camadas excluidas ou do andar de baixo, que  representam a  grande maioria da população.
 
Mesmo que sejam eleitos com o voto do povão e da classe média, ao serem financiados, legal ou ilicitamente  com dinheiro oriundo de grupos econômicos, nossos legisladores e governantes costumam  abrir as portas de seus gabinetes para  representantes desses grupos de interesse  e acabam patrocinando e apresentando projetos de leis, que se  transformam em leis; medidas provisórias propostas pelo poder executivo e que acabam sendo aprovadas docilmente pelo legislativo, onde estão parlamentares que foram eleitos  graças ao “apoio” financeiro desses mesmos  grupos de interesse. Geralmente, os políticos  e gestores governamentais do  escalão  adoram falar “em nome do povo”, mas na verdade agem na defesa dos interesses dos grandes grupos econômicos, aberta ou nos porões da política. A operação lava jato é apenas  a ponta do iceberg do que acontece na administração e na política brasileira.
 
Basta ver quem são os verdadeiros “donos” dos partidos políticos tanto a nível nacional quanto estaduais e municipais e há quanto tempo esses personagens estão empoleirados nas estruturas partidárias e a qual classe, estamento, categoria ou grupo econômico pertencem.
 
Por exemplo no Congresso nacional existem as tais bancadas, a da bala que defende os interesses dos fabricantes e comerciantes, legais ou ilegais, de armas; a  ruralista que representa os  interesses dos latifundiários e do agronegócio; a dos donos de escolas particulares, as de donos de hospitais particulares e de planos de saúde; a dos donos de onibus e outros meios de transporte de massa, a dos banqueiros,  que  representa os  interesses do Sistema financeiro privado e que agem  como verdadeiros agiotas, a dos empresários que defendem as medidas de interesse do referido setor, tem ainda a bancada da bíblia, mescla  de evangélicos e outros grupos conservadores.
 
A atuação dessas bancadas mais se parece com verdadeiros despachantes de luxo, abrindo as portas do poder executivo e as vezes  tentando até  interferir nas decisões do poder judiciário e de vez em quando propondo medidas ou votando algumas matérias que são verdadeiras migalhas em relação ao que é destinado ao povão.  Por exemplo, a bolsa empresário, via juros subsídiados, incentivos, renúncia fiscal e  vistas grossas ou conivência  com grandes sonegadores, é dezenas de vezes o total dos recursos destinados ao bolsa família ou outras políticas assistencialistas ou compensatórias.
 
A delação dos mais de 70 executivos e altos dirigentes da Odebrecht é um exemplo patente desta prática que,  com certeza é a norma secreta de inúmeras outras grandes empresas envolvidas em corrupcão com propinas a políticos e gestores que gozam de foro privilegiado/especial. O mesmo se pode dizer dos mais de 40 parlamentares federais , deputados e senadores, que figuram na LISTA  DO JANOT,  cujas investigações, devido ao foro privilegiado dos investigados, são de responsabilidade do STF e da Procuradoria Geral da República, mas que se desenvolvem a passos de tartaruga, bem diferente do rítimo imposto na mesma operação lava jato a cargo do Juiz Federal Sérgio Moro e da Força Tarefa  em Curitiba.
 
Este é o contexto em que surgiu e ainda se mantem esta excrecência jurídica, política e institucional tanto no Brasil quanto em alguns países que teima em ignorar os interesses da sociedade e as bases da cidadania. Em um próximo artigo analisarei alguns aspectos desta matéria que há décadas  está na “ordem do dia” ou na agenda política nacional e continua como um manto protetor para corruptos de alta envergadura e quão difícil tem sido para o Congresso Nacional acabar com esta vergonha que é o foro por prerrogativa de função, a  verdadeira base para que a impunidade dos  crimes de colarinho branco continue em nosso país.
Juacy da Silva

Juacy da Silva

Juacy da Silva, professor titular aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integral.
E-mail profjuacy@yahoo.com.br
Instagram @profJuacy
WhatsApp 55 65 9 9272 0052
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