Artigos / Eduardo Gomes

13/04/16 às 10:41

De privada

Magalhães Pinto dizia que política é igual nuvem: muda a todo o momento. Por isso, quanto a decisão do plenário da Câmara dos Deputados – onde começa o rito bicameral do processo -, não se pode falar com convicção sobre voto favorável ou contrário a admissibilidade (aprovada por 38 a 27 votos na Comissão Especial) do pedido de impeachment da presidente Dilma.

Oficialmente o que está sob análise parlamentar é a existência ou não de crime de responsabilidade (de Dilma) sobre as denunciadas pedaladas fiscais que motivaram o pedido de impeachment formulado pelos juristas Hélio Bicudo (fundador do PT nacional) e Janaína Paschoal. Porém, pelo que se deduz e também levando em conta a tradição menos republicana do Congresso, interesses inconfessáveis permeiam as articulações em Brasília.

Fundamentação legal e interesses inconfessáveis à parte. Mudanças da apresentação das nuvens, também. Em meio a tudo isso, o que me chama a atenção é o posicionamento do deputado federal Carlos Bezerra, declaradamente favorável à presidente Dilma.

Sempre sob fogo cerrado, Bezerra nunca viveu um dia sem carregar o peso de acusação disso ou daquilo outro. Porém, até agora, ninguém conseguiu sequer insinuar um ato de sua autoria contra o PMDB, do qual em Mato Grosso é uma espécie de presidente crônico ou pétreo.

Sem vacilar Bezerra sempre jogou o jogo partidário. Soube recuar quando preciso, avançou sempre que vislumbrou que seguir adiante era o melhor caminho. No começo dos anos 1980, sabedor da força nacional dos conservadores, participou com Ulysses, Quércia, Íris e outras grandes lideranças, da articulação para incorporar o PP ao PMDB e, assim, dar força ao seu partido contra o gigante PDS. Para tanto, em Mato Grosso dividiu palanque e poder com Osvaldo Sobrinho, Louremberg Rocha, Augusto Mário Vieira, Bento Lobo e outros exponentes da dita direita.

Coerente, Bezerra nunca deu um passo que não fosse em nome do PMDB, por aquele partido ou em busca de mais espaço partidário. Pecha de infiel não lhe cai bem. Em Mato Grosso ele é um dos poucos políticos fidelizados a partido, a exemplo dos irmãos Júlio e Jayme Campos no DEM (e suas denominações anteriores).

Bezerra sempre ficou no PMDB e nunca se aventurou por outras siglas como se viu em Mato Grosso com Dante de Oliveira, Pedro Satélite, Rogério Salles, Zé Carlos do Pátio, Baiano Filho, Percival Muniz e tantos e tantos outros.

Mato Grosso está surpreso com Bezerra, que deixa de lado seu partido em nome de um concubinato político com Dilma. Não creio que esse posicionamento seja uma cartada ou uma cartola da qual, na última hora, Temer tiraria o coelho desmoronador da resistência daqueles que teimarem até perto da votação, na defesa da presidente. Não vejo por esse ângulo, porque nosso velho cacique não tem apelo nacional para servir de exemplo e seu recuou não influenciaria na oposição dos outros sete integrantes da bancada mato-grossense na Câmara.

Numa longa trajetória Bezerra construiu uma história partidária. Essa construção nem sempre foi uma reta, porque em alguns momentos avançou por linhas tortas em nome do jogo do momento. Ela foi costurada em altos e baixos, com vitórias e derrotas, mas nunca sem obstinação. Com a legenda do velho, bom e saudoso Manda Brasa, Bezerra chegou à Assembleia em 1974. Acumula mandatos na Câmara. Por duas vezes foi prefeito de Rondonópolis. Venceu a disputa ao governo e ao Senado.

Senhor de seu voto em plenário, Bezerra já o declarou contrário ao impeachment. A Bandnews informou na manhã desta quarta-feira que somente dois deputados da bancada de 66 peemedebistas estão ao lado da presidente. A emissora não nominou, mas trata-se dele e de Valtenir Pereira. A decisão de Valtenir é compreensível, pois esse parlamentar não tem identidade partidária – troca de partido de acordo com suas conveniências. No entanto, a opção de Bezerra é algo intrigante.

No domingo, com transmissão pela televisão, veremos o voto de Bezerra em defesa da presidente. Independentemente do resultado da votação ele sepulta sua vida pública, muito embora ela ainda respire moribundamente até o final de seu mandato. Se houver recuo será uma espécie de vitória de Pirro, por sua postura até então.

No plano nacional, dividido, o Brasil espera o resultado da votação no domingo. Se Dilma cair, trocamos seis por meia dúzia; se ficar, o que resta de governabilidade irá pelo ralo. Entendo que precisamos de mudança, porém bem maior que essa ora representada pelo pedido de impeachment. No âmbito mato-grossense testemunhamos o fim da identidade partidária de maior nome regional do PMDB; sem  essa qualificação, inevitavelmente Bezerra sai militância pública que se arrasta a meio século e volta pra vida privada.
Eduardo Gomes

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Eduardo Gomes é jornalista e escritor
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  • por Luis Gonzaga Domingues, em 13/04/16 às 18:18

    Esse indivíduo fala o que não sabe. Aliás, a formação de é da área jornalística. São os representantes da classe dominante. Jamais produziram conhecimento científico, portanto são pessoas extremamente despoletizadas e analfabetos funcionais.

 
 
 
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